Entrevista com o Pe. Ángel Strada, ex-postulador pela beatificação do Pe. Kentenich
PJK, Paula Christensen/mkf – Ouvir das janelas do Vaticano a canonização do Pe. José Kentenich é, sem dúvida, um desejo secreto de todos os filhos de Schoenstatt.
Apesar de não ser tão simples, há grandes avanços no processo pela canonização do Pe. José Kentenich, Fundador do Movimento Apostólico de Schoenstatt.
Pe. Ángel Strada, de nacionalidade argentina, primeiro conselheiro da Direção Geral dos Padres de Schoenstatt, postulador das causas do Pe. Kentenich e de Mário Hiriart, destaca que há grandes avanços no processo de canonização, e além disso como se manifesta em profundidade o carisma e a personalidade do Padre em todo o que se trabalha no contexto do processo.
Especificamente em que etapa desse processo nos encontramos atualmente?
No momentos falta autenticar cada página que foi investigada e o relatório final da comissão da Diocese de Treves, para que se feche o processo na Alemanha. Daqui passa para Roma, onde a Congregação para os Santos pode questionar ou validar o processo. Antes há a revisão por oito teólogos e em seguida por oito cardeais e bispos. Uma vez que esta congregação vaticana aprove o processo, ficamos a espera de um milagre comprovado pela intercessão do Pe. Kentenich, vem então a sua beatificação e, após outro milagre, a canonização.
Conhecendo nosso Fundador em profundidade
Quais novas características foi possível descobrir no Pe. Kentenich, ao estudar os escritos dele, não publicados?
Há milhares de cartas nas quais se vêem muitíssimos aspectos de como ele acompanhava espiritualmente as pessoas. Os tipos de conselho que dava, como corrige, como adverte, como consolava, como consola. Por exemplo, muitas vezes ele disse: “Seja um raio do sol” para sua comunidade, para sua família. E também é muito freqüente o convite para a confiança, a confiança em Deus e a confiança em si mesmo. “Confie que Deus, o Senhor, lhe deu talentos para superar isto, confie em suas experiências positivas”, e outra coisa que reitera muitíssimo, por exemplo: “atue de acordo a sua consciência”, sabendo que muitas vezes vai provocar conflito com isso, mas “anime-se a ser senhor de si mesmo”. Também aparece muito o convite para a vinculação: vincular-se ao Santuário, ao diálogo com Maria. E ao final sempre diz “eu a acompanho, eu lhe acompanho”, “eu penso no senhor”, “rezo pelo senhor”, “a tenho presente”, “conte com minha oração”. São expressões muito fortes de compromisso pessoal. Assim se pode explicar que tenha tido tanta influência sobre as pessoas.
Se deparou com surpresas durante estas investigações?
Em geral o Pai manteve uma continuidade extraordinária. Os retiros pregados para as Irmãs e os casais tem uma profundidade maior do que outros retiros. Nunca estudamos um tema que fosse totalmente novo, eu diria que em geral não. O que há são escritos polêmicos, milhares de páginas sobre a relação dele com Vicente Pallotti. Ele escreve ao Superior Geral dos Palotinos, em um momento, uma carta que se não me engano tem umas 1.100 páginas. Ele o chama de carta, mas é tudo um tratado. É notável como deixa muito claro o que provém de sua obra e o que é próprio de Pallotti. Tem um conceito muito particular de humildade. Eu creio que em grande parte porque sente: “eu não posso guardar, não posso calar o que Maria realizou em mim”. Então vai dizer: “este elemento provém de mim, não provém de Pallotti”. O Pai tem uma autoconsciência sumamente forte de que Maria atua por meio dele. E aqui se descobre um traço psicológico; uma vez que está convencido de algo, ninguém o move. Quando ele está seguro, está seguro. O Padre Kentenich era de uma firmeza enorme, nesse sentido não conhecia o talento diplomático. O Pai não negociava.
Este traço de seu caráter explica a problemática de Milwaukee. O previsto era que adotando uma atitude rígida frente a Roma, eles mandariam um novo decreto, restringindo-lhe mais até a liberdade. Sem constrangimento ele o fazia e chegava o novo decreto. Ele respondia “estou cumprindo estritamente com as normas que o senhor me está impondo, mas não estou de acordo com sua fundamentação”. Ele obedece, sem impedimento, esse conceito de obediência exige muita maturidade do superior e do súdito. A vezes é muito desafiante a atitude do Pai, ele mesmo explica em suas cartas: “eu combino obediência e acatamento com franqueza, com liberdade interior e com ousadia”. Assim me explicou muitas coisas que passaram… nisto sim, tive muitas surpresas.
Por que era tão difícil para o Pai “negociar”?
O Pai e Fundador estava muito consciente de que tinha uma missão e que Deus lhe pedia determinadas coisas. Para uma pessoa que não tem essa consciência e que não se unia ao Pai, muitas vezes não lhe era fácil. E isso se nota muito particularmente quando o Pai voltou de Dachau: ele voltou com outra atitude, com uma atitude interior diferente. Até Dachau o Padre Fundador havia evitado falar de si mesmo, havia evitado que se falasse dele, que o fotografassem, não havia contado quase nada de sua historia pessoal.
Mas, depois de Dachau voltou totalmente convencido de que Schoenstatt é obra de Deus. Sua libertação é isso, é uma confirmação muito forte dessa verdade. Além disso, voltou convicto de que Schoenstatt tem que dar um salto, tem que sair, tem que se lançar na Igreja e no mundo. Ele se impressiona que Schoenstatt já é uma obra internacional. Então, é quando decide dar-lhe um centro pessoal que assegure a unidade desta Família em constante crescimento por todo o mundo. “E a única pessoa que pode fazer isso sou eu”, assegura. Está convicto de que a vontade de Deus é essa.
Então, permite que o fotografem, começa a falar de si mesmo, começa a insistir na vinculação a ele e isso destoa totalmente dos pallotlinos. Tanto que alguns dizem que o Pai voltou muito mudado de Dachau, voltou anormal e isto é transmitido também aos bispos. O Pai assume que é o preço que ele tem que pagar por algo que ele considera que seja vontade de Deus e pensa que é o que a obra necessita. Isto fere muito a uma boa parte dos bispos alemães e provoca todo o tema do 31 de maio.
Há algum episodio que tenha sido mais difícil para o senhor entender?
Há uma historia muito dolorosa. Há grandes padres pallottinos que foram dirigidos espiritualmente pelo Padre Kentenich. Por exemplo, um padre que um tempo foi Superior Geral e depois foi Vice-geral, em um momento disse ao Pai: “Já não o posso mais seguir”. É uma mudança muito grande que a mim pessoalmente custa muito, pelo drama humano que há aqui. Estando em Roma, ele escreve uma carta ao Padre Kentenich e lhe comenta que vai viajar para Schoenstatt. Este lhe responde: “Vá ao Santuário, leva-me também junto, agradece à Mãe pelo grande trecho de caminho que trilhamos juntos. Agora que nossos caminhos se separam, pede a Maria que abençoe ao senhor e que me abençoe”. É uma carta de despedida.
O modelo de santo
Como o Pai fazia para compreender, à luz de Deus, essas coisas tão dolorosas neste caminho que ia contra o convencional?
Há vezes em que o Pai disse: “Tenho a luz para o passo seguinte, mas não vejo o caminho”. É preciso ter o cuidado para não achar que o Pai, por haver desenvolvido tanto este caminho da fé prática na Divina Providência, recebia todos os dias um chamado de Deus dizendo-lhe o que tinha que fazer. O Pai tem muitos momentos de escuridão, e diz claramente: “Só tenho luz para o passo seguinte”.
Pe. Ángel, vendo a clareza que o Padre Kentenich tinha sobre si mesmo, sobre sua missão e todas essas qualidades pessoais para se vincular aos demais, em que medida esse modelo do santidade é aplicável a pessoas normais, sem uma missão de fundador, sem esse equilíbrio psicológico tão profundo que tinha o Pai?
Depende muito de como se propõe a imitar o santo. Não se trata de imitá-lo literalmente, porém, de percorrer o caminho que ele percorreu, de acordo a originalidade própria, com os poucos ou os muitos talentos que eu tenho em minha estrutura. Posso aproveitar a experiência que ele fez com sua originalidade e sua estrutura. Além disso, ele viveu numa realidade cultural e num momento muito diferente. Devo tratar de me apropriar originalmente dos valores que o animaram, mas dentro da minha realidade.
Temos que manter uma visão realista do Padre Kentenich, porque obviamente ele não nasceu santo. Ele percorreu um caminho longo e muito difícil. Temos que olhar o Pai como modelo, mas não somente no final de sua vida. Às vezes ele mesmo, o Padre Kentenich, dizia: “Nisso eu não sou um exemplo para os senhores”. Então, conhecendo a vida do Pai, fazemos o nosso próprio caminho, mas, assumindo os valores que o motivaram. Isso sim, temos nos segurar em sua mão, firmar-nos nele e pedir o seu apoio.
Bom, e como aplicarmos na vida prática estes muitos “amigos canonizáveis” que temos na Família de Schoenstatt como modelos para se imitar?
Creio que temos que agradecer a riqueza de santos que temos, porque são sinais da ação de Deus na historia da Família. Uma família religiosa que não tem santos, faltam-lhe títulos, falta-lhe riqueza. Além disso, o Pai considera que o Santuário é um berço de santidade: “Se você não pode demonstrar que deste berço nasceram santos, de que santuário me fala?”. É uma riqueza que se precisa saber investir.
Veja que lindo que Deus nos vai presenteando uma pluralidade de santos em diferentes épocas, diferentes sexos, diferentes missões, estados, etc. E respondendo: como eu os imito? Pode ter certas ocasiões em que me posso orientar muito mais pelo exemplo da Irmã Emilie, que me dirá como chegar ao Pai e Fundador e este me dirá como chegar a Jesus Cristo. Se a vida do fundador, que é um sacerdote alemão, nos parece uma realidade muito longínqua, temos o Mário, um leigo chileno, que caminhou nas ruas que eu caminho, que é uma historia muito mais próxima da minha e me facilita o caminho. Mas, em resumo, estes santos da Família são luzes, e não são para que fiquem debaixo da mesa, mas, temos que suspendê-las para que iluminem.
E como está com o milagre?
O Pai foi muito respeitoso às normas da Igreja. Ele sabe que para ser beatificado, ele em que fazer um milagre. Justamente por essa fé, estou muito tranqüilo nesse tema. Enquanto trabalhemos o melhor que pudermos não há mais o que fazer. Neste momento, é terminar toda a parte do processo sobre as virtudes. Peço-lhes para rezar pelo Pe. Jorge, da diocese de Treves, que é o que deve confirmar o relatório final. De certa forma, ele representa todas as pessoas que estão trabalhando para concluir esta etapa na diocese de Treves e é quem tem o poder para fechar esta etapa em que estamos.
Assim, rezando pelo Pe. Jorge e sem deixar de pedir a intercessão de nosso Pai e Fundador em qualquer “pequeno milagrinho” da vida diária, iremos amando a Igreja e a tudo o que tanto amou o Padre Kentenich durante sua vida. Iremos nos assemelhando a ele sobretudo em sua forma particular de vincular-se às pessoas e estaremos nos aproximando, sem dúvida, daquele dia em que o Santo Padre nos presenteia um novo santo para nossa Família.
Porque além de todos os avanços, há também a benevolência da parte de Sua Santidade Bento XVI, quem escreveu o prólogo de uma novena sobre o Padre Kentenich com as palavras com que intitulamos esta entrevista.
Para se ter uma idéia sobre o processo de canonização do Pe. Kentenich:
- 26.000 documentos não editados
- 9.500 cartas do Pai
- 8.000 páginas é o que escreveu em Milwaukee
- 350.000 páginas (mil livros de 300 páginas)
- Fama de santidade em 85 países do mundo
- Testemunharam 150 pessoas
- O registro das fichas de cada documento tem 4.800 página
Entrevista Feita por Paula Christensen, publicada na revista Vínculo, Chile.
Fonte: www.schoenstatt.de – Tradução: Nelci de Fátima Moraes