“Somente todos juntos podemos e devemos tornar presente a totalidade do seu rosto”
Homilia do Pe. Juan Pablo Cattogio, presidente da Presidência Internacional da Obra de Schoenstatt, na abertura do Ano Pe. Kentenich:
Querida Família de Schoenstatt,
Celebramos um novo aniversário da partida do Pai e Fundador, Pe. Kentenich. No próximo ano se completarão os 50 anos desse acontecimento. Por isso, abrimos o “Ano do Padre Kentenich”. Não se trata, meramente, de uma memória histórica, em que, com gratidão, reconhecemos que Schoenstatt deve a sua existência ao Fundador. Trata-se, antes, da própria identidade de Schoenstatt, da sua razão de ser e do seu futuro.
Um moderno artista africano pintou um quadro no qual duas pessoas, dois rostos de perfil, se olham nos olhos. Nesta obra está expressa a experiência humana fundamental: “Sou porque tu és”. Parafraseando esta expressão, a comunidade de uma das nossas casas, em Schoenstatt, dirige-se ao Pai e reconhece: Pai, nós somos porque tu és. Sim, somos Kentenich, somos porque tu és e somos o que tu és.
Dito teologicamente, trata-se da participação no carisma do Fundador, no seu espírito fundacional. Nada menos que, São João Paulo II, nos lembrou enfaticamente: Vocês estão chamados a participar da graça que o vosso Fundador recebeu e a oferecê-la a toda a Igreja. Pois, o carisma dos fundadores é uma experiência suscitada pelo Espírito, que é transmitida aos seus discípulos, para que, estes a vivam, a guardem, a aprofundem e a desenvolvam constantemente, na comunhão da Igreja e para o bem da Igreja” (20/9/1985).
Trata-se, portanto, de um carisma, de uma graça, de uma “experiência suscitada pelo Espírito” que, foi dada ao Pe. Kentenich mas, não para ele, para a sua própria salvação e santificação, mas para os outros, para uma missão. E, além disso, trata-se de uma “vocação” – “vocês foram chamados”, isto é, mais uma vez, trata-se da graça em participar neste carisma, nesta graça.
Na história de Schoenstatt experimentamos, vitalmente, que o Pai e nós nos pertencemos mutuamente, que pertencemos juntos. A Corrente do Pai e as suas múltiplas expressões – Jardim de Maria, Aliança Filial, Ato de Séquito e várias outras formas de uma Aliança com o Fundador – são testemunho disso. Por vocação, participamos no seu carisma e na sua missão, somos um com ele, na sua vida e na sua missão. Deus pensou-nos juntos, desde toda a eternidade. Ele uniu-me e uniu cada um e cada uma de vós, intima e inseparavelmente, à pessoa e ao destino do Padre Kentenich. Solidariedade de destinos, solidariedade indissolúvel. Com palavras simples, mas teologicamente precisas, o Pe. Kentenich expressou-o deste modo: “Estava previsto nos desígnios de Deus que vocês e eu nos pertencêssemos com uma profundidade singular. Nos planos de Deus nunca devo ter existido sem vós, nem vocês sem mim. Desde a eternidade Deus pensou-nos numa Aliança de Amor… Deus pensou-o assim, nunca me viu sem vós, nem a vocês sem mim, Ele não quer que eu cumpra a minha missão sem vós – tal como, tão pouco, viu Maria separada de Jesus – Ele pensou-vos, desde toda a eternidade, como meus colaboradores permanentes no cumprimento da minha missão…” (20/8/1947).
Gostaria de sublinhar que o nosso vínculo com o Pai e Fundador não é, em primeiro lugar, sentimental ou afetivo, mas é, principalmente, um vínculo de fé, que tem as suas raízes na fé de que, pela graça de Deus, somos chamados a participar do carisma, do espírito de Fundador, do Pe. Kentenich.
Ouvimos na Primeira Leitura uma passagem linda do Antigo Testamento. O povo de Israel é muito grande. Moisés não o pode conduzir sozinho. O sogro aconselha-o. Moisés pede a Deus: é demais para mim, não posso levar sozinho essa carga.
“O Senhor disse a Moisés: “Junta-me setenta homens entre os anciãos de Israel, que sabes serem os anciãos do povo e tenham autoridade sobre ele. Conduze-os à tenda de reunião, onde estarão contigo. Então descerei e ali falarei contigo. Tomarei do espírito que está em ti e o derramarei sobre eles, para que possam levar contigo a carga do povo e não estejas mais sozinho… Moisés saiu e disse ao povo as palavras do Senhor. Reuniu setenta homens dos anciãos do povo e os colocou em volta da tenda. O Senhor desceu na nuvem e falou a Moisés; tomou uma parte do espírito que o animava e a pôs sobre os setenta anciãos. Apenas repousara o espírito sobre eles, começaram a profetizar” (Nm 11, 16-17, 24-25).
Talvez seja esse o dom deste Ano do Padre Kentenich, que Deus pegue um pouco do espírito que pôs no coração do Padre Kentenich e o transmita a nós. Por isso, pedimos na oração especial deste ano: “Dá-nos do seu fogo e do seu espirito de Fundador!…Que o seu carisma viva em nós!”.
Ou, como o Profeta Eliseu que teve que implorar e insistir para receber “duas partes (dois terços) do espírito” do seu mestre, o Profeta Elias. “Tendo passado, Elias disse a Eliseu: ‘Pede o que quiseres, antes que eu seja separado de ti. Que posso fazer por ti?’ Eliseu respondeu: ‘Seja-me concedida uma porção dupla do teu espírito’. Elias replicou: ‘Pedes uma coisa difícil. No entanto, se me vires quando estiver a ser arrebatado de junto de ti, terás aquilo que pedes; mas, se não me vires, não o terás’” (2 Rs 2, 9-10).
Preferi pegar na outra primeira Leitura, pois mostra outro aspecto fundamental da nossa participação no carisma: não se trata do privilégio exclusivo de uns poucos especialistas em Padre Kentenich ou de alguns eruditos doutores. Todos participamos do seu carisma, cada uma e cada um de nós, cada grupo e cada comunidade. Kentenich é mais que todos nós e supera-nos, ninguém o esgota. Somente todos juntos podemos e devemos tornar presente a totalidade do seu rosto, toda a sua figura em plenitude. Cada uma e cada um, cada grupo, cada curso, cada Ramo, cada Comunidade, representa um raio do seu carisma, somos como as pedrinhas de um mosaico que, só juntas, mostram o todo. O grande desafio é que nos abramos uns aos outros, que permutemos vida, que trabalhemos juntos, que vivamos solidariedade efetiva, Cultura de Aliança. O mosaico é como um difícil e exigente quebra-cabeças que temos de montar. Só assim representamos integralmente o Padre Kentenich, só assim somos quem somos e o que somos.
Trata-se, portanto, de um carisma, uma graça para os outros, para uma missão. Por isso mesmo, não podemos guardar este dom para nós próprios. Carisma é dom e tarefa. Em vista disso, o Papa Francisco dirigiu aos Padres de Schoenstatt as seguintes palavras que podem servir de orientação e quiçá de advertência a toda a Família neste ano. “Preocupa-vos manter vivo o carisma fundacional e a capacidade de o saber transmitir aos mais jovens. A mim também me preocupa, que mantenham o carisma e o transmitam, de tal modo que continue inspirando e sustentando as vossas vidas e a vossa missão”. Mais importantes são as palavras seguintes, em que fala do dinamismo vivo de um carisma que se atualiza em contato com a realidade e, por sua vez, a transforma: “Vocês sabem que um carisma não é uma peça de museu, que permanece intacta numa vitrine, para ser contemplada e nada mais. A fidelidade, o conservar puro o carisma, não significa, de modo nenhum, fechá-lo numa garrafa selada, como se fosse água destilada, para que não se contamine com o exterior. Não, o carisma não se conserva tendo-o guardado; há que abri-lo e deixar que saia, para que entre em contato com a realidade, com as pessoas, com as suas inquietações e os seus problemas. E, assim, nesse encontro fecundo com a realidade, o carisma cresce, renova-se e também a realidade se transforma, se transfigura pela força espiritual que esse carisma contém em si” (3/9/2015).
O carisma do Pai e Fundador é a nossa missão e a nossa contribuição para a Igreja e para a sociedade, esse carisma quer transformar a realidade e inspirar uma nova Cultura de Aliança. Este é o fruto que devemos dar e que só podemos dar se “permanecemos nele” – como as vides unidas à videira – “Permanecei em mim, que Eu permaneço em vós. Tal como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, mas só permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanece em mim e Eu nele, esse dá muito fruto, pois, sem mim, nada podeis fazer” (cf. Jo 15).
Querida Família de Schoenstatt, todos desejamos que o processo de beatificação do Padre Kentenich avance e que um dia seja canonizado. Também esse é o nosso pedido neste Ano do Padre Kentenich. Não obstante, penso que deveríamos pedir, de coração, que, sobretudo, cresça a aspiração à santidade na nossa Família, em cada um e em cada comunidade. Lembremos a condição do ‘20 de Janeiro’: se tomarem a sério a Inscriptio, se tomarem a sério a aspiração à santidade, então, ficarei livre. Isso nos dirá hoje o Pai: só então, será canonizado! São João Paulo II já nos desafiou: “Canonizem-no vós mesmos!”. Nesse sentido, também no funeral do Padre Kentenich, o Bispo Tenhumberg exortou a nossa Família com as palavras de São Paulo: “Vocês são o meu cartão de apresentação!”
“Pelos frutos se conhece a árvore!”. A antiga lei do Evangelho hoje tem mais valor que nunca: pelos frutos se conhece a árvore, pela santidade dos seus filhos e seguidores se conhece a santidade do Pai e Fundador, na vida santa da Família e nas obras apostólicas fecundas se manifestará a santidade do nosso Pai. Outros filhos de Schoenstatt já estão a abrir o caminho ao Padre Kentenich em Roma, em primeiro lugar, o Beato Karl Leisner, talvez, em breve, também Franz Reinisch, o decreto de virtudes da Ir. M. Emilie já está pronto, a Positio de José Engling avança – no próximo ano se completarão 100 anos da sua morte – a de Mario Hiriart foi apresentada e, em breve, será a de João Pozzobon, algum dia seguirá o Pe. Hernán Alessandri e, se Deus quiser, muitos mais. Assim se tornam realidade as palavras do Documento de Fundação, que a “capelinha” se converta em berço de santidade, berço de santos canonizáveis e canonizados. Este é o meu desejo e o meu pedido, neste dia, para todos nós. “Fui Eu que vos escolhi a vós e vos destinei a ir e a dar fruto, e fruto que permaneça”
Pe. Juan Pablo Cattogio
15 de Setembro de 2017
Fonte: schoenstatt.org / Tradução: Lena Castro Valente, Lisboa, Portugal
Foto: Pilgerzentrale Schönstatt
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