Entrevista com os superiores gerais do Instituto de Famílias
Ir. M. Nilza P. Silva / Juliana Dorigo / Karen Bueno – Espelhar-se no Bom Pastor… assim o casal argentino Patricia e José Antonio Kostner vê sua atual missão. Desde julho do ano passado (2018), eles foram eleitos os superiores gerais do Instituto de Famílias de Schoenstatt e, a partir de então, estão sob sua responsabilidade cerca de 300 famílias, de 16 países. A tarefa consiste em serem pais espirituais para uma comunidade internacional, que almeja viver o espírito da Sagrada Família de Nazaré.
Eles contam: “Nós ingressamos no Instituto nos anos 90, quando iniciamos o nosso noviciado. Um ano após assinar o contrato perpétuo, fomos escolhidos para participar de um Capítulo Geral da comunidade, na Alemanha, e nos tornamos parte da Direção Geral, como chefes gerais dos curso. Depois, em outro Capítulo, fomos nomeados assistentes e agora, neste último Capítulo, que aconteceu em julho, Deus quis que nos tornássemos a família superiora geral de todo o Instituto internacional. Nós nos colocamos à disposição, como instrumento dele, para esta grande missão que teremos”.
Em visita ao Brasil, acompanhando a jornada anual da comunidade, Patricia e “Pepo” nos contam mais detalhes sobre sua nova tarefa e a realidade atual do Instituto:
Quando falamos da tarefa de um superior geral, por exemplo, numa comunidade celibatária, nós sabemos bem qual é a sua tarefa. Mas, no Instituto de Famílias isso é um tanto diferente. Qual é a tarefa de um superior geral no Instituto de Famílias?
É incrivelmente ampla. A primeira tarefa e a primeira missão, segundo entendemos, é estarmos próximos de nossas famílias e estarmos a serviço de tudo o que nos pedem. A família superiora geral deve estar próxima, ser como pais, como bons pastores, que conhecem seus problemas, seus desejos, seus sonhos, seus anseios…
Também temos muitas tarefas que são da parte administrativa. Em Schoenstatt temos sob nossa responsabilidade o Monte Nazaré, que é o monte das famílias. Ali existem duas casas e o Santuário das Famílias que estão sob os nossos cuidados. Isso implica tempo de trabalho. E, graças a Deus, em nossa Direção Geral somos em cinco famílias e dividimos nosso trabalho. Cada um tem uma função, dentro de tantas funções, então nós sentimos o apoio de todos. E podemos dizer que esta Direção Geral – que foi eleita há pouco tempo – traz uma novidade muito grande: pela primeira vez, em toda a história de nossa comunidade, não temos famílias alemãs; somos todos da América Latina e uma família da Espanha. Isso implica que nós deixamos de falar o alemão como idioma oficial em nossas reuniões e passamos a uma espécie de “portunhol”, porque somos todos hispano e luso-falantes. Isso também implica um desafio, porque nós recebemos, durante muito tempo, várias famílias alemãs que trabalharam com muito protagonismo em nossa comunidade. É como se, nesse momento, Deus dissesse: “Bom, é hora da América Latina devolver um pouco de tudo o que foi recebido” e nós tomamos isso como a ‘corrente de retorno’ que nosso Pai falava.
De fato há uma tendência em nossa comunidade de crescimento maior na América Latina do que na Europa. Infelizmente nossa comunidade está muito estancada na Europa, não temos vocações. Graças a Deus, na América Latina temos essa continuidade de poder formar cursos. Agora, por exemplo, começa o noviciado aqui no Brasil, com casais de São Paulo e Campinas.
É possível pertencer ao Instituto sem pertencer a um Curso?
Desde o ano passado estamos fazendo uma experiência nesse sentido, de começar, com alguns postulantes, um processo de formação personalizada. Temos casais educadores encarregados por essas famílias, que as acompanham no tempo de noviciado, como se fosse um curso. E, depois, estamos abertos para como Deus vai seguir falando. Por enquanto é um experimento que ainda não sabemos como vai terminar. Estamos conscientes de que falta uma dimensão comunitária a estas famílias, então temos algumas ideias sobre como podemos suprir essa questão comunitária que falta.
Nós pensamos de ter, na Europa, um ou dois encontros grandes por ano, encontros fortes entre todos os postulantes e candidatos, para que tenham também essa experiência comunitária. É um desafio grande. Todos fomos educados em um curso e isso é algo novo. Mas vamos ver como Deus nos indicará o caminho.
Qual é a originalidade do Instituto?
Em nosso Instituto estamos comprometidos por meio de um vínculo jurídico. Nós temos uma família superiora geral, uma Direção Geral e, como famílias, devemos obediência aos nossos superiores; o que recebemos deles é o que vivemos.
E a missão fundamental é o modo de viver os conselhos evangélicos em um estilo original, segundo nosso Pai. Nós vivemos uma pobreza mariana apostólica, uma obediência familiar, uma pureza matrimonial e o fazemos de tal maneira que isso chegue a formar uma nova ordem social, para transformar a sociedade a partir de nossa vida. Como o Pai nos colocou como pars motris (parte central) de toda a Obra de Famílias, somos também responsáveis pela vida dessa Obra de Famílias, cada um segundo suas possibilidades.
O Pai nos conciliou como uma comunidade de casais que podem ter uma vida consagrada. Nós agora estamos – como costumamos dizer – a caminho de Roma, porque estamos tratando de redigir nossos estatutos, que ainda não tínhamos. Isso para que Roma, algum dia, possa nos reconhecer também como uma comunidade de vida consagrada. Esse trabalho não é fácil, mas já temos algumas portas abertas e estamos em diálogo direto com o Vaticano, com visitas a diferentes autoridades e contato com distintos Dicastérios. Como comunidade, temos tudo o que o Pai propôs para os Institutos.
Jornada anual do Instituto de Famílias do Brasil em 2019
Atualmente não existe na organização hierárquica da Igreja um Instituto Secular de Famílias. Como os senhores sentem a posição da Igreja em relação ao seu Instituto?
Os encontros que tivemos em Roma têm sido com experiências de todo o tipo. Tivemos respostas negativas, como quando nos disseram: “No Direito Canônico não há lugar para vocês”, e muita abertura por parte de alguns cardeais. A última entrevista que tivemos com o Cardeal [Kevin Joseph] Farrell, responsável pelo Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, foi muito positiva. Eles estão muito abertos para nos escutar e o Cardeal nos disse palavras muito pontuais e valiosas: “Vocês contem-me, ensinem-me qual é a sua especificidade e qual a sua originalidade. Como vivem? Para que eu possa contar a uma equipe, que eu preciso formar, para que estudem o seu caso e como vivem”.
E esta equipe está formada por nada menos que o Cardeal responsável pela Vida Religiosa e pela Doutrina da Fé. Ou seja, temos que fazer bem todas as coisas. E para isso estamos trabalhando.
Refletindo sobre nossos estatutos, descobrimos que há muitas legislações que estão no Código de Direito Canônico e que faltam, todavia, incorporar ou resolver. No último Capítulo apresentamos os pontos a serem renovados no estatuto e seguimos aprofundando esses temas. Tudo isso estamos fazendo com a ajuda de um time, em cooperação com a Universidade Católica do Chile, onde há uma especialista em Direito Canônico e em redação –porque não é fácil redigir um estatuto, ele pede uma linguagem muito específica, jurídica, que é necessário cumprir.
Nós temos algo como que um estatuto, que chamamos de “Livro da Família” e é para uso interno da comunidade. Nele está toda a explicação sobre como vivemos, quem somos, nossa forma de vida, nosso estilo de vida. Mas, ao pensar num estatuto, trata-se de algo mais pontual e específico, jurídico, que tem uma linguagem muito especial – e é preciso respeitar, porque senão não teremos êxito em Roma.
Hoje, na Igreja, não se fala de família sem citar Amoris laetitia. Que contribuição essa Exortação Apostólica trouxe para o Instituto de Famílias?
Uma contribuição sumamente grande e total. Ou seja, quando estudamos essa Exortação Apostólica dizemos: “Esse Papa deve ter lido nosso Livro da Família”. Porque realmente ele “bate na tecla” de muitos pontos comuns da nossa comunidade e do nosso estilo de vida. A tal ponto que todo o trabalho anual da comunidade foi trabalhar sobre este Livro da Família e o lema do ano era justamente: Amoris Laetitia, a alegria do amor matrimonial.
Não somente nos vimos refletidos em Amoris laetitia, como também vimos nossos anseios de chegar a viver todas essas coisas que o Papa Francisco diz. Tudo é um reflexo daquilo que o Pai queria para as suas famílias, não só do Instituto, mas para as famílias schoenstattianas. É uma contribuição valiosíssima sem dúvida alguma.
Cremos que essa Exortação Apostólica resume muito da pedagogia, porque não é tanto algo intelectual, mas muito pedagógico e prático para a aplicação no dia a dia da família. Já foram escritas muitas coisas teológicas sobre a família e o matrimônio, mas isto é bem mais pontual no sentido pedagógico, é algo prático que podemos aplicar. Podemos estudar Amoris laetitia por um longo tempo.
Faz 50 anos da volta de nosso Fundador ao lar eterno. Como o Pai vive no Instituto de Famílias hoje?
Ele é sempre bem presente. Nosso Pai falou muito pouco ao Instituto de Famílias, porque não teve tempo, mas toda a herança que deixou é extremamente valiosa. Ele dizia que o carisma de um fundador se vê 50 anos após sua partida; para nós, seu carisma de ser família e de fazer família onde estivermos está muito presente em nosso Instituto.
Além disso, o grande anseio secreto de nosso Pai sempre foi trabalhar pelas famílias, mas, em sua vida apostólica, ele teve pouco tempo para isso. Depois, no exílio, ele se deu conta de que esse era um presente de Deus, porque teve tempo suficiente para trabalhar com as famílias de forma bem prática e próxima, face a face. Inclusive, nos deixou folhas escritas, que são todas as conversas das “segundas-feiras ao anoitecer” com as famílias, que podemos reler muitas vezes e sempre descobrimos coisas novas. Assim, temos um grande tesouro e o Pai é o guia em tudo para o nosso Instituto.