“Mesmo quando não se pode curar, sempre é possível tratar, consolar e fazer a pessoa sentir uma proximidade que demonstre mais interesse por ela do que pela sua patologia” (Papa Francisco) [1]
Karen Bueno – Toda semana, há 16 anos, a Ir. M. Cleude Buzzacaro espera pela condução que a leva até sua “segunda casa” – dessa forma carinhosa ela chama o hospital onde passa pelo tratamento de hemodiálise, em Atibaia/SP. A maioria dos pacientes que recebem esse procedimento tem o rim comprometido por causa de diabetes ou hipertensão. Porém, essa não é a realidade da Ir. M. Cleude. Como um caso mais raro, ela é portadora de uma doença congênita (ou seja, já nasceu com a doença) que afeta seus rins, obrigando-a a passar pelo tratamento, regularmente, por três vezes na semana.
“Eu tenho rins policísticos, uma doença congênita que só fiquei sabendo no ano 2000. Mais tarde, em 2005, eu tive uma nefrite aguda, fui internada e, desde então, meu rim foi parando, aí tive que entrar em diálise”, ela conta.
“Nós temos o Capital de Graças, onde eu coloco tudo, todos os dias”
Ao celebrar o Dia Mundial do Enfermo, em 11 de fevereiro, encontramos em Ir. M. Cleude o testemunho do que é ser missionário a partir da enfermidade. Sem reclamar das dores, restrições ou dos desafios, ela comenta que “é uma vida difícil, mas, por outro lado, sinto alegria por existir algo que possa me fazer viver”. E diz que vivenciar a doença “é uma cruz, mas, por trás dela tem benefícios que eu tenho sempre que enxergar”.
O setor de hemodiálise, uma família
Com tantos anos de tratamento, Ir. M. Cleude já conheceu muitas pessoas diferentes. Ela conta: “No setor de hemodiálise, entre médicos, enfermeiros e pacientes, a gente forma uma família, porque convivemos dia a dia. Quando falta um, logo perguntamos por ele. Os médicos do setor são como nossos pais. Tem alguns que cuidam de mim já há 16 anos. Eles têm um carinho especial por cada um. Todos os dias eles veem como estamos, às vezes tem pessoas que ficam meio depressivas e eles dão um estímulo; os enfermeiros são muito atenciosos com os pacientes”.
Ser uma missionária no hospital
A realidade de quem necessita da hemodiálise é desafiadora: a alimentação é restrita, o consumo de líquidos é muito baixo, tudo isso somado a tantas outras complicações. “Normalmente os pacientes são muito fechados e muito tristes por causa da situação. Um paciente de hemodiálise traz muita limitação para uma família, por exemplo: não pode passear em lugares distantes, não pode comer muitas coisas que gostam, beber… tem famílias com geladeira sem nada, para não pôr em risco os pacientes que não conseguem se policiar”.
É diante dessa realidade que a Ir. M. Cleude vê seu campo de missão. “Sinto que é possível fazer um ‘apostolado do ser’ muito grande. A veste (de Irmã de Maria), eles veem como sinal de Deus. Uma vez um médico me disse que meu turno é sempre tranquilo, porque os pacientes ficam calmos quando eu estou com eles – isso, para mim, é ser sinal de Deus, levar paz”.
Várias histórias surgem na mente da Irmã ao pensar no “apostolado do ser”, como essa: “Tinha uma senhora que queria sempre ficar perto de mim. Quando ela chegava e eu não estava, perguntava por mim e se acalmava quando eu chegava. Nos dias que ela esteve mal, na UTI, pediu ao filho para que fosse me chamar. Eu subi para visitá-la e ela ficou mais tranquila. Faleceu alguns dias depois disso. Para mim isso é o apostolado do ser”.
O apostolado da oração
Ainda falando sobre missão, Ir. M. Cleude conta: “Tem também outra forma de ser missionária que é pela oração. Fiquei algumas vezes internada. Uma vez, eu estava rezando o terço e veio o enfermeiro para fazer os procedimentos. Ele me perguntou se eu estava rezando. Eu disse ‘sim, e estou rezando também por você’. Perguntei se ele era católico e lhe dei um tercinho. Ele ficou muito feliz e contou para os outros. Quando trocou o plantão, veio outro enfermeiro me pedir um terço. Naqueles dias em que fiquei internada, distribuí seis tercinhos”.
Além disso, ela conta: “Quando um paciente está internado, está mal, eu peço para os padres irem visitá-lo e dar a Unção; estou sempre acompanhando”.
“Coragem, vamos em frente, eu também estou com você!”
O tratamento constante exige diversas renúncias da Ir. M. Cleude, como, por exemplo, a impede de passar férias com sua família. “Mas – ela faz questão de acentuar – estou contente com isso, pois Deus colocou isso para mim”.
Sua vida teve uma reviravolta que exigiu amor e doação: “Hoje eu não posso mais ter uma tarefa profissional, mas vejo que ser missionária é minha tarefa principal, é a tarefa de poder levar Deus, levar consolo a essas pessoas. Isso me preenche e me torna feliz, porque eu sei que não posso trabalhar braçalmente, mas espiritualmente eu estou trabalhando e isso me alegra”.
As palavras que ela sempre dedica aos pacientes e colegas são as que gostaria de dizer a todos os enfermos hoje: “Muitos pacientes se sentem deprimidos porque não podem fazer várias coisas e se sentem um peso; eu sempre digo a eles: agora nós não podemos fazer ‘isso’ ou ‘aquilo’, mas podemos dar um sorriso a alguém, uma palavra, um consolo, uma oração… Sempre digo a todos: coragem, vamos em frente, eu também estou com você. Eles ficam contentes e eu saio contente, porque cumpri uma missão”.
[1] PAPA FRANCISCO. Mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial dos Enfermos de 2022
Muito obrigada, querida Ir.M.Cleude pelo seu testemunho muito edificante e encorajador Que Deus lha abencoe!