Flávia Nunes Costa Ghelardi – O mundo atual nos compele a viver num ritmo frenético. Tudo deve ser instantâneo, ao alcance de um clique. Vivemos de uma atividade a outra, quase sem pausa e quando paramos para “descansar”, normalmente nossa mente está olhando uma tela, com uma enxurrada de informações, imagens, vídeos. São poucos os que escapam a essa realidade. A grande maioria de nós vive pressionada por todo tipo de exigências, tentando responder as obrigações matrimoniais e familiares, os requerimentos do trabalho e, para muitos também, aos múltiplos compromissos apostólicos.
Precisamos de espaços que permitam encontrar a nós mesmos
Esse ritmo de vida pode causar uma série de doenças “modernas”, como a síndrome do burnout, ansiedade, depressão. Mesmo aqueles que escapam de ficarem doentes, eventualmente anseiam por uma paz maior. Às vezes um acontecimento, como a morte de alguém querido, nos tira um pouco desse turbilhão em que vivemos e paramos para pensar: para que tudo isso? Qual é o sentido da minha existência?
Para conseguirmos responder a essas questões e nos confrontar com o que dá o sentido verdadeiro a nossa vida, precisamos de espaços que nos permitam encontrar conosco mesmos e que nos conduzam a um contato mais profundo com Deus, pois só Ele possui as respostas que precisamos.
A meditação da vida diária
O Pe. José Kentenich tinha uma preocupação constante em conduzir o ser humano atual até um encontro com o Deus vivo, por meio das criaturas e das circunstâncias concretas que o rodeiam. Para ajudar nesse encontro vital com o Senhor, desenvolveu uma prática de meditação, a chamada “meditação da vida diária”, que vem responder a esse anseio e essa necessidade.
Para o homem moderno é extremamente difícil compreender e praticar a meditação, pois a forma que organizamos nossa vida está muito orientada para o exterior, para o fazer, produzir, fabricar, organizar e racionalizar. Vivemos em uma cultura marcara com o selo da extroversão.
Passar um tempo com o Senhor
A falta do cultivo da vida interior (o Pe. Kentenich fala de uma cultura sem alma) afeta o ser humano em vários aspectos de sua pessoa, inclusive no tocante à profundidade de sua fé. Recebemos a semente da fé em nosso Batismo, porém ela precisa ser cultivada para se desenvolver e se tornar um suporte para a nossa vida. Esse cuidado se dá por meio do contato íntimo e pessoal com o Senhor. Sem isso, a fé pode morrer.
O Pe. Kentenich se preocupava também com isso, para que seus filhos espirituais tivessem uma plena confiança no Pai, com uma “fé prática na divina providência”. Porém, o ser humano só consegue confiar em quem conhece. Para conhecer, precisamos passar tempo juntos. Além disso, é importante conseguir enxergar os inúmeros cuidados que Deus tem conosco a cada dia, demonstrando seu amor infinito por nós.
Como alcançar uma vida mais harmônica?
Como aprender a parar e deixar de ‘sermos vividos’ pelos acontecimentos?
Como fazer que nossa vida de fé seja mais aprofundada e que nosso contato com Deus seja mais pessoal?
Subir até o coração de Deus
O Pe. Kentenich nos dá a resposta: meditação da vida diária. Diz ele:
“Nosso método preferido de meditação consiste em revisar e saborear, em revisar com antecedência e saborear depois. Isto deveria ser uma atitude permanente entre nós, um hábito. A partir de cada realidade, por mais íntima que esta seja, devemos saber subir até o coração misericordioso e bondoso de Deus Pai. Enquanto isso não tenha se convertido em uma segunda natureza para nós, queremos exercitar mais e mais até consegui-lo.
Queremos ingressar na escola de amor, da oração interior. Não estamos orientados somente por esta forma de meditação. Podemos aplicar também outros métodos de meditação. Porém, dada a importância que reveste introduzir a Deus na vida em nossa vida, nos encontrarmos com o Deus da vida em nossa vida e responder a ele a partir de nossa vida, então, penso que, por um certo período, nossa ocupação predileta deve ser revisar e descobrir, no tempo dedicado à meditação, onde Deus veio ao nosso encontro no dia de ontem.” |
Um método de meditação para quem vive no meio do mundo
O Pe. Rafael Fernandéz, em seu livro “Como aprender a meditar?”, explica “O Fundador está pensando em um método de meditação especialmente apto para as pessoas que estão chamadas a encontrar a Deus no meio do mundo, por meio das criaturas. Ou seja, um método para quem não pode nem deve abandonar as realidades desse mundo: sua família, seu cônjuge, seus filhos, seus negócios e tudo o que isso implica, para se retirar e contemplar a Deus na solidão.
Esse é o pano de fundo da meditação da vida diária como o Pe. Kentenich a concebe. Ele quer nos dar um caminho que nos leve a entrar em comunhão com o Deus providente, que nos ensine a descobrir e comungar não só com o Cristo presente nos Evangelhos, mas com o Cristo presente na história, em nossa história pessoal e nos acontecimentos do mundo.
De nenhuma forma essa acentuação deixa de lado o Deus da Eucaristia ou o Deus presente na Palavra. Mas sim, integra e destaca com força o Deus da vida”.
O objetivo da meditação é amar mais
Essa forma de meditação não é como uma análise, um estudo de algum aspecto da doutrina ou dos ensinamentos da Igreja, para que tenhamos um conhecimento maior sobre o tema. O objetivo da meditação da vida diária não é saber ou conhecer mais, mas amar mais através do aprofundamento de nosso vínculo de amor pessoal com Deus.
“A meditação deveria se tornar uma escola de amor por eminência. Esse é o costume que deveríamos adquirir. Não uma escola de ciência, assim não é um estudo propriamente dito, mas uma escola de amor. Se quiserem saber se meditaram bem, devem se perguntar apenas: na meditação aprendi a amar, a amar de forma correta?” (Pe. Kentenich) |
A partir de hoje, iniciaremos uma série de artigos para desenvolver o tema da meditação da vida diária e assim aprendermos a colocar em prática essa grande riqueza ensinada pelo nosso Pai e Fundador.
* Flávia, com seu esposo Luciano, pertence a União de Famílias de Schoenstatt
Fotos: Ir. M. Nilza P. da Silva