Eu não quero perdoar. Não é justo. Essa pessoa me magoou demais. E o pior: não se arrependeu e não pediu perdão.
Flávia Nunes Costa Ghelardi – E agora? Será que essa atitude de não querer perdoar realmente me faz bem? Quando alguém me causa um mal, essa ofensa atinge diretamente o meu sentimento de justiça. E a justiça exige reparação para o mal cometido e a punição daquele que ofendeu.
Porém, o perdão está além da justiça, ele entra no âmbito da misericórdia. “Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão a misericórdia” (Mt 5,7). A misericórdia implica em dar ao outro aquilo que ele NÃO tem direito. E o que deve nos mover a agir com misericórdia, é o amor.
São Paulo nos exorta: “Portanto, como eleitos de Deus, santos e queridos, revesti-vos de entranhada misericórdia, de bondade, humildade, doçura, paciência. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, toda vez que tiverdes queixa contra outrem. Como o Senhor vos perdoou, assim perdoai também vós. Mas, acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição.” (Col 3, 12-14)
O perdão liberta
Somos convidados a colocar em prática a misericórdia e o perdão. Mas por quê? É porque o perdão nos liberta. Aquele que fica remoendo os fatos, revivendo os acontecimentos que feriram o seu coração, permanece escravo daquele que o ofendeu. Escravo porque não se liberta e não consegue viver sem pensar naquela ofensa.
Quando conseguimos perdoar, nos sentimos mais leves, mais felizes, gerando até um sentimento de compaixão por aquele que nos ofendeu. Conseguimos também nos libertar do passado, de ficar tentando modificar o que já aconteceu ou ficar imaginando como tudo seria se aquela ofensa não tivesse acontecido.
Consciência das próprias limitações
Perdoar não é esquecer e nem fingir que não aconteceu nada. Perdoar é tomar a decisão de que aquela falta que o outro cometeu contra si não vai mais lhe incomodar. E para isso, a pessoa precisa ter a consciência de que também erra, de que também magoa e que precisa sempre do perdão do outro.
Quanto maior for a consciência de que somos seres limitados, de que frequentemente cometemos erros, de que sempre precisamos do perdão, principalmente de Deus, mais fácil será perdoar os erros do outro, principalmente os daqueles que convivem diariamente conosco.
Devemos pensar: se eu tivesse nascido na mesma família da pessoa que me ofendeu, sofrido os mesmos traumas, recebido a mesma educação, poderia até agir muito pior que essa pessoa que me magoou. Precisamos procurar remover as camadas dos defeitos e até das maldades dessa pessoa, para enxergar o bem que certamente há em seu coração.
O perdão não é uma solução para ofensa
O perdão não ficar indiferente. Não é uma solução para ofensa, ficar frio ou insensível perante o mal. Implica sofrer, sentir a pena e depois perdoar e desculpar quem ofendeu. Perdoar significa que o amor que sentimos é tão grande que vence a ofensa.
O fato de ter perdoado a pessoa não significa necessariamente que preciso conviver com ela ou reatar o nível de intimidade que havia antes da ofensa. Não precisamos nos expor a sermos ofendidos novamente, mas devemos aprender a ter uma convivência sem rancores.
Perdoar não é fácil, mas é possível
Perdoar não é uma atitude fácil. Dependendo do grau da ofensa, da profundidade da cicatriz deixada, o perdão pode demorar muito tempo para ser alcançado.
Não é preciso ter pressa. O que é urgente é decidir que irá perdoar e que aquela falta, aquela mágoa, não irá mais lhe aprisionar. Devemos sempre pedir a Deus, a graça do perdão. Aproximar-se do coração de Jesus, que tem um bálsamo eficaz para curar as feridas do seu coração. Sem a graça de Deus, não é possível perdoar, pois a nossa natureza ferida pelo pecado original é orgulhosa e tende sempre a pensar em si mesma, em sua ferida, olhando os acontecimentos somente pelo seu ponto de vista. O orgulhoso não perdoa. É preciso humildade para pedir perdão e para perdoar.
O Sacramento da Reconciliação (Confissão) é um meio importantíssimo para conseguir o perdão, tanto de si mesmo, como perdoar os demais. É um sacramento de cura, que restaura a alma e traz a paz interior. Pode demorar muito tempo para conseguirmos perdoar, mas a Confissão é um verdadeiro remédio, que vamos tomando até fazer efeito.
Como sei que perdoei alguém?
Sabemos que realmente conseguimos perdoar quando lembramos do acontecido, sem que essa memória traga algo de ruim, de perturbação. O perdão faz com lembremos, mas ficamos leve, não pesa o coração.
O perdão é fundamental e precisa ser dado sempre e nas pequenas coisas, desde algo que o irrita e que a pessoa faz sem saber até as coisas que ela faz conscientemente para irritá-lo e magoá-lo. O perdão devolve o equilíbrio ao relacionamento e quando ele é negado, pode causar inúmeras doenças, inclusive o câncer e outras doenças autoimunes.
Vamos seguir o exemplo de Jesus que nos ensinou a rezar: “perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos aos que nos ofenderam” (Mt 6,12). E também na Cruz, pediu: “Pai, perdoa-lhes; porque não sabem” (Lc 23,34).
*Flávia e seu esposo Luciano pertencem à União de Famílias de Schoenstatt
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Fonte: Blog Fortalecendo sua família