Há pouco tempo, o Papa Francisco manifestou seu desejo de ser enterrado na Basílica de Santa Maria Maior (em Roma), algo inusitado, considerando o costume dos papas do último século que foram todos enterrados na Basílica de São Pedro. Por trás desta decisão, há muito mais que seu habitual estilo de romper esquemas preestabelecidos.
A basílica Santa Maria Maior
A construção da Basílica de Santa Maria Maior foi determinada pelo Papa Sixto III em 431, após o Concílio de Éfeso, no qual Maria foi proclamada Theotokos (Mãe de Deus). Uma antiga tradição relata que o ícone de Nossa Senhora ali presente teria sido pintado pessoalmente pelo evangelista São Lucas, em um pedaço da mesa da Última Ceia de Jesus com seus apóstolos, ou ainda, de uma mesa construída por Jesus que a Virgem Maria teria guardado. No entanto, os estudiosos acreditam que foi pintado por volta do século VIII e alguns dizem que, tal como o temos atualmente, não pode ser situado antes do século XIII. A expressão Salus Populi Romani (salvação do povo romano), com a qual o ícone foi intitulado, vem da Roma pré-cristã e foi adotado para referir-se a Nossa Senhora logo depois que Constantino legalizou o Cristianismo no Império Romano, em 313.
O lugar mais mariano de Roma
Aqui interessa destacar o fato de que a basílica onde se encontra esta imagem, além de ser – por prioridade e tradição histórica – o lugar mais mariano de Roma, amado e visitado por muitos papas, era um dos lugares preferidos de Bergoglio em Roma e continua a sê-lo durante o seu pontificado, como destino de constantes peregrinações.
Antes e depois das suas viagens internacionais, ele faz questão de passar pela mesma basílica para se encomendar aos cuidados de Nossa Senhora Salus Populi Romani. Quando fez dez anos de pontificado, já superava mais de cem visitas a este lugar próprio da devoção do povo romano. Nada disso é simples coincidência, pois os gestos deste Papa são especialmente carregados de significado, visto que ele costuma pregar mais com ações do que somente com palavras.
De fato, em seu primeiro ato como Pontífice, no dia seguinte à eleição e à sua inesquecível aparição na varanda central da Basílica de São Pedro, Francisco fez uma peregrinação à Basílica de Santa Maria Maior, para confiar a Maria o seu pontificado.
Um coração mariano e universal
Quando vai a Santa Maria Maior, Bergoglio está pensando em sua missão universal. O que ele vive com Nossa Senhora em Roma é o que deseja para a Igreja universal, tanto que vincula essas visitas às suas viagens internacionais. De fato, já naquela sua primeira peregrinação – a de 14 de março de 2013 – no final da visita, ocorreu outro breve episódio que revela um pouco mais do coração mariano de Francisco. Seu coração romano também é universal. Conforme narra o jornalista Sérgio Mora, ao sair da basílica romana, Francisco saudou as pessoas que lá trabalham, religiosos, religiosas, agentes de segurança e outros. Um por um. Nesse momento, uma freira lhe disse: “Sou mexicana”. E o Papa imediatamente respondeu: “Eu também sou guadalupano”, referindo-se à Virgem de Guadalupe, Padroeira do México e de toda a América… Mais que querer agradar aos mexicanos, Francisco fez referência ao seu marianismo originário. Iria se esforçar para que este fosse cada vez mais “romano”, mas jamais deixaria de ser “latino-americano”…
Desse modo, pode-se dizer que a mensagem que está por trás, tanto da invocação guadalupana quanto da romana, oferece algumas chaves de leitura para o modelo de Igreja que Francisco quer implantar: uma Igreja que abraça e protege, com amor e ternura, uma Igreja próxima do povo, uma Igreja maternal e, portanto, mariana. Uma Igreja que é povo de Deus ao qual são chamados todos os povos da terra. Sob a proteção de Nossa Senhora Salus Populi Romani, o coração do Papa continua a se expandir, tornando-o cada vez mais seu devoto.
Este texto é uma síntese de diversos artigos do Pe. Alexandre Awi, publicado pela Caderno Fé e Cultura, da Arq de São Paulo. Leia os artigos aqui, a partir da pág. 11