EUCARISTIA E MISSÃO
Eucaristia, sacramento e instituição
A Eucaristia é o centro sacramental da História da Salvação cristã, o centro emanente e culminante da vida da Igreja e da vida da comunidade cristã, o centro referencial de todo o organismo sacramental e o centro vital do ser e do existir do cristão. Na Eucaristia e pela Eucaristia chega à máxima expressão o ser e o agir cristão como “adorador em espírito e verdade” (Jo 4, 24), oferecendo a Deus um culto agradável e incorporado a Cristo pelo Batismo, participando do seu Mistério Pascal. A Eucaristia é e será sempre, de fato, o centro da vida cristã, quando somos capazes de viver seu mistério e de transformar nossa vida por este mesmo mistério da fé. Não basta crer que a Eucaristia é o ato religioso cristão único e o mais relevante da semana. É preciso articular a fé e a vida em relação e a partir desse momento celebrativo, de maneira que a própria Eucaristia seja verdadeiramente “fonte e cume” (SC 10) da vida cristã; pois mediante ela se edifica e cresce sem cessar a Igreja de Deus (LG 26; UR 15).
O Reino de Deus constitui o motivo central da mensagem de Jesus, de toda a sua vida e seu agir (Mc 1, 15; Mt 4, 17). Para Ele, o Reino, sua vinda e proximidade equivalem ao advento da soberania do amor de Deus. Por isso, o Reino de Deus supõe, em princípio, mais a comunhão de Deus com os homens que domínio ou poderio divinos, mais a paternidade de Deus que sua realeza, e o seu sinal preferido é o banquete familiar, a comunhão de vida e os sinais que dela decorrem: reino da verdade e da vida, da graça e da santidade, da justiça, da paz e do amor.
Na última Ceia (Lc 22, 14-20; 1 Cor 11, 23-26) encontra-se o melhor compêndio da vida e da morte de Jesus, de seu sentido diaconal (de serviço) e de sua estreita relação com o Reino. Na última Ceia, Jesus mostra uma confiança radical na vinda do Reino de Deus, “até que Ele venha” (Mc 14, 25; 1 Cor 11, 26). O novo banquete para a comunidade apostólica e o “fazei isto em memória de mim” (Lc 22, 19) é a ceia do Senhor e não mais a antiga ceia pascal, que somente interessa como marco ou introdução (Ex 12) que enquadra a celebração convivial e comunional cristã, enquanto a Páscoa judaica constitui um adequado ponto de referência para o novo êxodo do povo de Deus, a Igreja, na nova e eterna Aliança (Mt 26, 28).
A tradição cristã fala da Eucaristia como alimento, como comida e bebida espiritual que, à semelhança do maná ou da água da rocha no deserto, nos serve de sustento em nossa peregrinação até a ‘terra prometida’. Assim também afirma o Novo Testamento: “Tomai e comei” (Mt 26, 26), disse Jesus; “quem come a minha carne e bebe o meu sangue terá a vida eterna” (Jo 6, 54).
1 Eucaristia, sinal de Deus e comunhão eclesial
O banquete eucarístico não tem como objetivo primordial o sustento ou a alimentação dos homens (1 Cor 11, 20-22), senão que sua finalidade primordial é a comensalidade, ou seja, o comer e beber humanamente, fraternalmente, conjuntamente = COMUNHÃO. O ato de nutrir-se, de comer e alimentar-se, tem, certamente, sua razão de ser e é algo legítimo – necessário – ; porém esse ato somente é verdadeiramente humano quando se insere em uma ação simbólica, que é o convite fraternal ou o banquete-comunhão. A comida se humaniza quando os homens são capazes de partilhar com seus semelhantes.
O sacramento da Eucaristia não está radicado exclusivamente no pão e no vinho isolados em si mesmos, senão no pão e no vinho enquanto assumidos e utilizados por uma comunidade que se serve deles como dons (frutos da terra – de Deus- e do trabalho humano), ou seja, como instrumento e veículo de inter-relação e de comunhão inter-humana, de comunhão dos santos. Pão e vinho são também sinal e ‘sacramento’ da presença de Cristo, não como realidades autônomas, mas enquanto assumidos em um gesto comunitário de doação, de entrega por amor e de oblação pessoal – como Jesus – de cada cristão em favor de todos.
No mistério eucarístico o Senhor está presente, em primeiro lugar, como aquele que convida ao banquete da salvação ou do Reino, chamado que se repete após a ressurreição aos discípulos : “Vinde, comei” (Jo 21, 12) . No banquete eucarístico é o Senhor quem convida e preside, Ele que parte o pão e o distribui na pessoa do sacerdote, já que é Ele que se dá e se entrega a si mesmo em comunhão através dos dons do pão e do vinho eucaristizados. A Eucaristia implica um “comer com Jesus”, antes de comê-lo ou comungá-lo. O que vale dizer, é preciso vincular-nos ao Senhor e incorporar-nos a Ele, na Igreja, pela fé, para que possamos alimentar-nos verdadeiramente de seu corpo e seu sangue.
A fé, pois, não é somente o fruto ou conseqüência da comunhão sacramental eucarística mas, sobretudo, – enquanto fé eclesial, comunitária – é também o pressuposto necessário (não a causa) para que se possa dar a presença real no sacramento. Esta fé, realizada na vida, baseada na re-memoração (anámnesis – memorial) e alicerçada na oração (epíklesis– invocação do Espírito Santo) é a que possibilita a presença do Senhor nos dons do sacramento da Eucaristia. Cristo deixou a Eucaristia na e para a sua Igreja como sinal visível daquela unidade e caridade com a qual Ele quis ver reunidos e fraternos todos os cristãos.
E assim reconhecemos e perguntamos: quanta distância, por nossa culpa, separa a realidade que vivemos, dos planos e das intenções do Senhor Jesus quando instituiu o sacramento da Eucaristia? Quantos lugares ainda estão vazios porque não conhecem a Jesus, a Eucaristia, a Igreja?
2 Eucaristia, sacrifício e aliança
A partir da tradição hebraica, Jesus utilizou a categoria de banquete para expressar o sentido sacrifical da última ceia, como também a vinculação entre esta Ceia e a sua morte próxima (Ex 24, 4-8; Mc 14, 24). Assim pode-se afirmar a dimensão sacrifical da vida e da morte de Jesus, como da última ceia, como proveniente da consciência e da intenção do próprio Jesus, porém entendendo esse sacrifício como algo radicalmente novo, desde a entrega de si mesmo no serviço aos irmãos, para a remissão dos pecados (Mt 26, 28).
O sacrifício de Jesus tem sua raiz na doação total de sua pessoa em favor da humanidade, já presencializado pelos discípulos na última Ceia e que tem o seu ponto culminante na entrega total na cruz. A entrega que Jesus faz de si mesmo aos discípulos sob o sinal do alimento, dos dons do pão e do vinho, nos torna claro por meio dos dons sua existência sacrifical, sua procedência do Pai e sua entrega absoluta a Ele. Através desse gesto, Jesus não somente simboliza e faz presente sua entrega e doação pessoal, mas introduz os comungantes em sua entrega sacrifical ao Pai, pelos homens.
Evidente é que não cabe falar, na Eucaristia, de uma repetição do sacrifício de Cristo ou de um novo sacrifício que complemente algo fundamental ao já realizado por Jesus. A Eucaristia tem um valor sacrifical que lhe outorga a presença de Jesus Cristo como sumo sacerdote e de seu sacrifício. Sacrifício e sacerdócio que por parte de Jesus e, segundo a tradição cristã, consistem em sua atitude de oblação e entrega como adoração, súplica e ação de graças ao Pai e que se presencializam na Eucaristia. A tradição da Igreja ensina que o sacrifício de Cristo se faz presente na forma de mistério, porém real na celebração eucarística e por Cristo é re-apresentação ao Pai ou presencialização do único e perfeito sacrifício de Jesus.
A Eucaristia é, pois, participação antecipada do banquete escatológico que, enquanto banquete, implica a entrega e a oblação total em uma comunhão (sacrifical) plena entre Deus e os homens e entre os homens em Cristo. Nessa autodoação total, no mais puro amor, consiste a plenitude do ser e do existir de Deus, e em uma autodoação total, ainda que na “dor do amor e da morte”, consiste também a plenitude e a consumação do existir e do viver humanos: transformar-nos naquele que recebemos.
Porém, esse sacrifício da nova e eterna Aliança, espiritual, mas real de Cristo ressuscitado, só pode fazer-se presente e de algum modo visível na Igreja através dos sinais do pão e do vinho. Como diz Santo Agostinho, o sacrifício da Igreja é “o sacramento cotidiano do sacrifício de Cristo”, porque nem o sacrifício de Cristo se pode fazer presente e dissociado do sacrifício da Igreja, nem o sacrifício da Igreja tem valor algum e nem pode dar-se separado do sacrifício de Cristo, de maneira que “não é celebrado o sacrifício do Senhor se não responde à paixão (de Cristo) a oblação e o nosso sacrifício” (Cipriano).
3 Eucaristia, amor que liberta
Todo sacrifício tem como objetivo último a comunhão de amor entre Deus e os homens, que por sua vez deve gerar uma comunhão ou comunidade inter-humana. Isso significa que toda verdadeira comunhão tem algo de sacrifical. Ou como expressam os Santos Padres, a edificação da comunidade eclesial constitui o verdadeiro sacrifício da Igreja como sacramento do corpo e do sacrifício de Cristo. O sacrifício para o qual a assembléia se congrega é o de Cristo, certamente; porém também é o do corpo unido pelos vínculos da caridade divina, do amor que liberta, que constrói e que redime e salva.
A Eucaristia se orienta, em última instância, à nossa união com o Espírito de Cristo e a uma comunhão de amor pleno com Ele. A participação no corpo e no sangue do Senhor não são um fim em si mesmos, mas um meio para alcançar esta comunhão ‘espiritual’ com Cristo, para alcançar essa união do nosso espírito com o seu, da nossa pessoa com a sua (Jo 6, 63).
A comunhão da nova e eterna Aliança, pois, não é somente uma comunhão no corpo e no sangue de Cristo, mas também no seu Espírito de amor. E por Ele, é também uma comunhão eclesial, porque a Igreja de Cristo não acontece senão ali onde o Espírito de Cristo congrega uma comunidade vivificando-a e congregando-a em um único Corpo (Mt 18, 20). Por isso, não basta comer e beber participando dos dons do pão e do vinho, mas é preciso crer e acolher com o coração puro e sincero a presença daquele que se entrega generosamente na Eucaristia. Somente assim acontece a verdadeira comunhão com o Senhor. Desse modo, a Eucaristia nos faz participar no dinamismo vital que constitui o mistério da Trindade divina e que é o modelo e fonte de toda unidade e comunhão inter-humana no mistério de amor (Jo 17, 21-23).
O cristão não vive somente sua relação com a Eucaristia no momento da celebração e da adoração, senão também ao longo de sua vida. A liturgia eucarística e a liturgia da vida estão intimamente unidos. O mesmo termo ‘liturgia’ indica primordialmente o culto espiritual, existencial e vital dos cristãos que, exercendo seu sacerdócio, oferecem seus corpos como ‘hóstias vivas’ e apresentam a Deus seu sacrifício espiritual permanente, como oferenda agradável, por mediação de Cristo, o eterno sacerdote do Pai. E a Eucaristia, verdadeiro coração da liturgia, é o lugar onde, a partir da oblação infinita e a vontade soberana de Cristo, confluem de modo harmônico a celebração, a adoração e a vida eucarísticas. Pois, se a Eucaristia é oferenda para a vida, a vida também deve ser oferenda para a Eucaristia; e assim, a Eucaristia que celebramos é sempre o mistério que cremos e o amor de Deus que experimentamos.
4 Eucaristia e missão
“A Eucaristia faz a Igreja e, por sua vez, a Igreja faz a Eucaristia”. Essa é uma expressão típica dos primeiros séculos do Cristianismo, retomada com interesse no século XX e que traduz bem o Ite, Missa est!
a) Fundamento eucarístico da missão
A “missão” são as tarefas que deve cumprir a comunidade inteira, e cada um de seus membros, ao seu nível e segundo seu próprio carisma, seguindo o mandato do mesmo Cristo e aceitando consciente e responsavelmente os compromissos assumidos diante (dentro) da Igreja, por meio do Batismo, da Confirmação e da Eucaristia. Hoje são evidentes alguns princípios que podem ser recordados: que a Igreja, para sê-lo na fidelidade, deve ser uma Igreja missionária; que essa missão compete a todo o povo de Deus e não somente à hierarquia; que cada cristão deve assumir sua responsabilidade na missão, segundo seu carisma e vocação; que os sacramentos, para serem celebrados com dignidade, devem vir acompanhados de uma ação missionária evangelizadora e catequética; que não há oposição, senão complementariedade, entre sacramentos e evangelização; e, por fim, que a Eucaristia é o lugar privilegiado de renovação e de compromisso da missão.
Pelo fato de a Eucaristia ser uma ação ritual, não quer dizer que não implique de diversas maneiras a missão. Ao contrário, é o lugar privilegiado de concentração e expressão, de renovação e compromisso da missão, de envio para a missão (cf. D. BOROBIO, Ministerios en la comunidad, Barcelona, 1999, pp. 76-99). Para isso, basta recordar a respeito um dos lugares evangélicos paradigmáticos, como é o do encontro de Jesus ressuscitado com os discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 13-35): pela palavra de Jesus, que lhes explica o acontecimento de sua morte e ressurreição, e pelo “partir do pão”, os discípulos renovam sua fé e confiança (v. 31), e sentem-se impulsionados a voltar para Jerusalém para anunciar aos Onze a notícia: “Naquela mesma hora, levantaram-se e voltaram para Jerusalém, onde encontraram reunidos os Onze e os outros discípulos. E confirmaram: realmente, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão! Então os dois contaram o que tinha acontecido no caminho, e como o tinham reconhecido ao partir o pão” (vv. 33-35).
Isso é o que explica, ao menos em parte, que a Eucaristia tenha sido substituído, por “Missa”, do verbo latino mittere-missus, que significa “enviar, enviado” (Ite, Missa est!, Ide, a missa terminou), para cumprir a missão, como que dizer, cumprir as tarefas encomendadas e recomendadas pelo mesmo Senhor, recordadas e renovadas na Eucaristia, em ordem a estender o Reino e edificar a Igreja no mundo.
b) A Eucaristia como renovação da missão
A Eucaristia é o lugar da renovação da missão por três razões fundamentais: pelos sujeitos que participam, pelo mistério que se celebra, pela Igreja que se compromete.
1 Pelos sujeitos que participam: o sujeito da celebração da Eucaristia, em sentido mais restrit,o é o iniciado na vida de Cristo e da Igreja, através dos sacramentos do Batismo e da Confirmação, que aceita livre e responsavelmente sua fé e sua pertença à comunidade eclesial. Quem, desde essa atitude, participa da Eucaristia, não pode não renovar a missão que tem recebido ao ser iniciado e que expressa e celebra permanentemente a ceia do Senhor. A Eucaristia constitui-se em lugar de revisão e renovação da missão, em um momento para uma verdadeira tomada de consciência sobre o direito e o dever de participar nas tarefas de edificação da Igreja no mundo (cf. AG 36; AA 3-7; PO 5).
2 Pelo mistério que se celebra: a Eucaristia também é renovação da missão por outro motivo central, a saber, porque celebra o mistério do qual tira e no qual se funda a missão da mesma Igreja. Com efeito, a Igreja, o mesmo que os sacramentos da Igreja, nasce do Mistério Pascal, morte e ressurreição, ascensão e envio do Espírito Santo. Nesse momento Cristo transmite o Espírito e a missão (cf. Jo 20, 22-23), e o poder de perdoar e batizar (cf.Jo 20, 23; Mt 28, 19; Mc 16, 15-16), com a recomendação de pregar o Evangelho e de ser suas testemunhas “até os confins da terra” (Mc 16, 15; Mt 28, 18-19; At 1, 8). E é impossível celebrar o Mistério Pascal sem sentir-se chamados, implicados, comprometidos, afetados pela missão que nasce da Páscoa. A Eucaristia é chamado, é memorial da missão pascal de Cristo em sua visibilidade histórica. Comporta em si mesma o anúncio da Páscoa e o compromisso para seguir anunciando-a. Ao celebrar o memorial da Páscoa, a comunidade inteira se situa de frente aos planos de Deus e à aliança nova, com todas as suas exigências e implicações.
3 Pela Igreja que se compromete: a Eucaristia renova a missão da Igreja, na mesma medida em que renova a própria Igreja. E a renovação da Igreja implica necessariamente a aceitação renovada dos compromissos com a Igreja. Se a assembléia eucarística é a epifania e sacramento realizante da Igreja, tem que ser também renovação e realização da missão da Igreja. A Eucaristia é “o centro de toda a vida cristã para a Igreja, universal e local, e para todos os fiéis individualmente” (IGMR 1). Na Eucaristia culminam a evangelização, a catequese e o serviço fraterno, a caridade, a consagração do mundo e o ministério sacerdotal. Porém, ao mesmo tempo, da Eucaristia emanam a nova força e o novo compromisso da inteira comunidade e de cada um de seus membros para seguir cumprindo, com mais empenho e eficácia, a missão recebida e celebrada (cf. SC 10).
c) A Eucaristia como expressão do objeto da missão
A mesma configuração estrutural e realização ministerial da Eucaristia nos revela e indica o objeto da missão. Nesse sentido, a Eucaristia é também expressão e realização, indicativo e imperativo, anúncio e encargo da missão eclesial em toda a sua integridade e variedade de objetivos.
Em primeiro lugar, vemos que a Eucaristia, como todo sacramento, se estrutura sobre uma articulação de palavra e sinal, anúncio e gesto, verbo e ação. Essa estrutura, ao mesmo tempo que nos recorda o ser e o atuar de Cristo-sacramento, nos indica como deve ser o cumprimento da missão por parte da Igreja-sacramento de Cristo: uma missão que consiste fundamentalmente em palavra e ação, em pregação e testemunho, em anúncio da mensagem e em obras de justiça e caridade. A Eucaristia nos recorda permanentemente que não pode haver cumprimento verdadeiro da missão ali onde tudo se reduz à Palavra, ou onde tudo se reduz ao Rito.
Em segundo lugar, a Eucaristia, ao ser lugar privilegiado da expressão e realização da estrutura ministerial da Igreja, é também momento explicativo e indicativo dos objetivos da missão eclesial. Com efeito, a Eucaristia realiza em si mesma o tríplice múnus ministerial:
a) ministério da Palavra (profético): anúncio da Boa Nova = leituras, homilia, monições, palavras proféticas;
b) ministério cultual (sacerdotal): ação litúrgica e ritual, oferenda dos dons, oblação sacrifical, oração eucarística, cantos;
c) ministério do serviço da caridade(real/pastoral): coleta e comunhão de bens, distribuição da comunhão, reconciliação com o irmão e compromisso com a justiça.
Assim, esta realização do tríplice ministério – missão profética, sacerdotal e real – dentro da Eucaristia é para a Igreja como o memorial permanente dos objetivos de sua missão na vida e no mundo, ou seja, suscitar a fé pela Palavra, compartilhar a vida pela caridade, dar graças e animar a esperança pelo culto.
d) A Eucaristia como envio para a missão
A Eucaristia supõe a reunião (assembléia, congregação) e a dispersão ou o envio. O ritmo reunião-celebração-dispersão não tem nada de novo em relação a outros tipos de assembléia. O que, sim, é novo, é a intenção da reunião, o conteúdo da celebração e a finalidade da dispersão. Nossa dispersão não é uma simples separação; é um autêntico envio para a atuação coordenada nos diversos âmbitos (ambientes) e setores da vida.
A mesma expressão “missa”, a despedida que se faz ao final “Podeis ir em paz”, assim como a bênção que a acompanha, indicam que se trata não só de dispersar-se, senão de dispersar-se para cumprir uma missão ou tarefa, e não precisamente por conta própria ou em solidão (solitário), mas por encargo de Cristo em solidariedade eclesial, e com a bênção de Deus. É impossível que a Eucaristia alimente a fé e não leve a comunicá-la, converta o coração e não mova a pregar a conversão, realize a unidade e não impulsione a superar as divisões da vida, suponha um testemunho e não leve a ser testemunhas, seja sinal de reconciliação e não mova a superar os ódios…
Por outro lado, o compromisso ético ou o contradom (resposta) é algo intrínseco à mesma celebração eucarística: “O processo de intercâmbio simbólico com Deus não pode deter-se com a oferenda cultual, como se a prática litúrgica fosse declarar-nos livres de dívidas com Ele. A oferenda cultual é somente a figura simbólica de um contradom que se há de verificar em outra parte: na história (…). Os membros da assembléia se vêem comprometidos a viver sua própria oblação, deles mesmos, nessa entrega de si ao próximo em seguimento a Cristo e que se chama ágape fraternal (…). Essa dimensão ética não é simplesmente uma conseqüência extrínseca do processo eucarístico, senão que lhe pertence a título de elemento intrínseco” (cf. L.M. CHAUVET, Símbolo y sacramento, Barcelona, 1990, pp. 283-285), onde o autor destaca a dinâmica da celebração, distinguindo “dom, recepção, contradom”.
A força da missão da Igreja está na Eucaristia. A espiritualidade da missão é eucarística. O projeto da missão é um projeto eucarístico; o projeto de missão é um projeto de comunhão, ela cria comunhão. O memorial eucarístico faz emergir três valores missionários: gratidão, gratuidade e responsabilidade. O gesto da “fração do pão” é dom e graça para a vida missionária. A Eucaristia é sempre celebrada, de certo modo, sobre o altar do mundo. A vida missionária, portanto, é fração, é partilha, é doação à humanidade. A cada “Amém” após a comunhão diz-se um “Sim” à missão universal; após cada comunhão eucarística dizemos “Sim”, isto é, afirmamos que a Eucaristia é fonte e cume da vida e da missão da Igreja.
Que o 15º CEN, celebrado em Florianópolis de 18 a 21 de maio de 2006, possa nos enriquecer com esta dimensão essencial da Eucaristia, isto é, compromisso e alimento para a missão de evangelização!
Prof. Pe. Pedro Alberto Kunrath