“A beatificação virá no seu momento, mas depende também do empenho de cada um”
Karen Bueno – Se depender de Dom Roberto Lopes, o Pe. José Kentenich não terá descanso. Dom Roberto é vigário episcopal para os Institutos de Vida Consagrada, Sociedades de Vida Apostólica, Movimentos Eclesiais e Novas Comunidades, também é delegado arquiepiscopal para a Causa dos Santos no Rio de Janeiro/RJ. Com um carinho especial pelo Movimento Apostólico de Schoenstatt, ela dá alguns conselhos sobre o processo de beatificação do Pai e Fundador, Pe. Kentenich:
Por que é importante que uma pessoa seja canonizada, seja ela quem for?
É sempre importante na tradição na Igreja, já desde o início do cristianismo, a questão do testemunho. Inclusive o Santo Padre, Papa Francisco, tem insistido muito sobre isso. Ele mostra que a evangelização não significa proselitismo, mas testemunho. E, desde o início, nós temos [santos], como o primeiro mártir, Santo Estevão. Depois nós vamos encontrar nos séculos I, II, III um grupo imenso. Até certo momento, você via um bispo, um papa, uma monja, os religiosos que eram canonizados e parece que o batizado, o leigo, ele não teria possibilidade a isso. E João Paulo II foi mostrando que, pelo contrário, a gente vai encontrar grandes figuras [leigas] na história da Igreja, mesmo reis e rainhas, também pessoas simples. João Paulo II mostra que o mundo deve estar atento a essa santidade dos leigos. Aí começam estudos sobre casais – hoje é possível que um casal leigo seja canonizado. Você tem, por exemplo, a questão da juventude, do jovem, da criança. Até 1983, você poderia ter uma criança mártir, já uma criança que não sofreu o martírio, não poderia ser beatificada – esse é o caso concreto dos pastorinhos [de Fátima]. Houve uma alteração dentro da legislação sobre isso, dando essa possibilidade, por isso eles foram canonizados no ano passado, e não como mártires. Quando a Igreja realiza um processo, é porque há uma manifestação dos fiéis. São os fiéis que pedem ao bispo, ao ordinário que reconheça, naquela pessoa, diante de todo seu testemunho, seus serviços de obra de misericórdia, de caridade, que ele possa ser um candidato à beatificação e canonização.
E o Pe. Kentenich? Em sua visão, por que seria importante canonizá-lo?
É interessante que muitas obras e muitos movimentos começam de forma muito informal e familiar, como foi em Schoenstatt. Os carismas, as espiritualidades são um dom de Deus, suscitados pelo Espírito Santo e confirmados pela Igreja em certo momento. Schoenstatt hoje vai por tantos países, é interessante a gente ver a questão dos jovens, também das famílias, a força que a espiritualidade tem, o testemunho. No centenário [da Aliança] eu estive na grande festa em Schoenstatt e algo que me chamou muito a atenção é justamente essa espiritualidade, esse carisma que consegue movimentar as famílias – e como é importante esse testemunho familiar. É evidente que por trás de tudo isso existe um homem que teve uma intuição.
Eu me lembro, quando era jovem estudante em Roma e fui fazer uma pesquisa na Alemanha, fui a Dachau (para o campo de concentração). Sabia da sua história [do Pe. Kentenich], mas fiquei surpreso de ver, fiquei muito emocionado. A questão de seu amor por Maria, vemos grandes reflexos.
Um problema grande, quando você faz um processo [de canonização] com uma figura como o Pe. José Kentenich, é a questão do volume de obras que foram escritas. Essas obras se multiplicam por outras correntes: discípulos, teólogos… É também evidente o grande interesse dentro da própria Mariologia sobre suas palavras. Existem processos que são mais simples e outros demoram um pouco mais, é evidente que tem que ser trabalhado, ser respeitado o tempo do processo, porque cada caso é um caso. Agora, quem pressiona é o povo. A impressão que me dá, pelo que escuto, é que há uma expectativa do povo de Deus. O povo tem que incomodar o Pe. José Kentenich pedindo graças e milagres, porque depois, toda a parte de metodologia de trabalho, do processo, se resolve tranquilamente.
O Pe. Kentenich esteve aqui no Rio de Janeiro, ficou hospedado no convento de Santo Antônio. Também esteve em Londrina/RS, Santa Maria/RS e tantos outros lugares. Temos histórias belíssimas de seus discípulos, mesmo em Santa Maria, o processo que está tramitando do Servo de Deus João Pozzobon. É um processo que está bem adiantado. Então nós temos um histórico bonito. E o Brasil também. Essa semana um jornalista me perguntou o porquê do Brasil ter poucos santos e beatos. Hoje, graças a Deus, esse número aumentou um pouquinho, mas o porquê é justamente também pelo pouco conhecimento sobre a santidade, a questão da própria história, das dioceses se debruçarem com os processos. Eu tenho acompanhado o padre que está em Santa Maria, também a postuladora em Roma [da Causa de João Pozzobon] e a gente vai vendo a beleza de todo esse processo.
O que o senhor já descobriu sobre o Pe. Kentenich? Como o vê hoje?
Primeiro, que era um homem de temperamento forte, um alemão.
O alemão é muito duro, mas também muito dócil. Eu tive minha formação no Mosteiro de São Bento, em São Paulo/SP, e quando entrei eram mais de 20 alemães, então a gente aprendeu a mergulhar nessa cultura. A gente vê que, ao mesmo tempo em que tem toda uma rigidez de horário, de disciplina, eles têm um coração extremamente dilatado de bondade. E ele [Pe. Kentenich] tinha esse lado, não é a toa que se encantou por Maria. E foi através de Maria que colocou os dons que Deus lhe deu a serviço.Ao mesmo tempo, ele era um grande professor, foi um mestre e continua ensinando através dos seus escritos. O bonito na vida da Igreja, nos carismas é que aqueles discípulos que se identificam [com o carisma] devem dar continuidade à fundação. Ninguém tem o direito de interromper aquele carisma. E a gente tem visto isso, especialmente entre os Padres e as Irmãs de Schoenstatt, os membros dos Institutos, a maneira como eles têm levado o carisma adiante. Na celebração desses 50 anos, a nível mundial, o que está acontecendo hoje nas catedrais é justamente isso, um gesto de gratidão, ao mesmo tempo em que é para mostrar à Igreja que o Movimento de Schoenstatt é um Movimento vivo. E a questão da beatificação e canonização virá no seu momento, mas depende também do empenho de cada um, seja das equipes históricas, críticas, dos teólogos.
Como podemos ajudar no processo de beatificação?
Eu sempre digo: vocês têm que incomodá-lo, porque nós precisamos de graças e milagres. Para a beatificação, é um milagre, então não importa em que ponto está o processo do Pe. Kentenich. E que tenha material suficiente para ser analisado, e isso compete aos teólogos e àqueles que são nomeados. Também rezar para que os bispos da região, na Alemanha, possam colaborar, tendo esse desejo de concretizar esse processo. Temos que incomodar bastante ao Pe. Kentenich.