77 anos após sua morte, seu testemunho segue inspirando schoenstattianos ao redor de todo o mundo
Jaqueline Montoya – Dizer a verdade ou calar-se? Enfrentar sem temor aquilo que não concordo ou aceitá-lo para evitar o conflito? Em tempos de relativismo e de querer agradar aos outros custe o que custar, sobressaem-se personalidades livres e autênticas, que sofrem para encontrar seu lugar. Pe. Franz Reinisch (ou Francisco Reinisch) foi uma dessas personalidades. Firme em suas convicções, morreu ao negar o juramento à bandeira do regime nazista. Seu ato consciente de entrega fez com que ficasse conhecido como “mártir da consciência”.
O herói de Schoenstatt tem sua vida conhecida e relatada no livro “O Sim e o Sangue”, de Olivo Cesca. Muitos já tiveram contato com a obra e puderam assim conhecer a trajetória do jovem em seu caminho rumo ao sacerdócio, o contato com Schoenstatt, com o Pe. José Kentenich e detalhes de seus últimos dias de vida na prisão, antes de ser decapitado. Hoje, de forma especial, queremos refletir sobre o que o fez seguir adiante, mesmo sabendo o caminho a que isso levaria.
A liberdade da consciência
Sua origem austríaca e seu posicionamento contrário ao de Hitler fizeram com que se tornasse inimigo do regime nazista. Em 1940 foi proibido pela Gestapo (polícia alemã) de pregar. Seu caráter firme e suas respostas cortantes impressionavam, a ponto de ser convidado a passar para o lado inimigo, somando forças à Gestapo, o que recusou.
Em 1941 foi convocado oficialmente, por duas vezes, para alistar-se no exército nazista. Diante da situação, refletia sobre o quadro político e a figura do anticristo que Hitler representava. Para ele, prestar juramento ao nazismo era aliar-se a um criminoso. Chegou a afirmar “Nossa consciência nos proíbe obedecer a uma autoridade que só espalha assassinatos e mortes, por causa de sua vontade de dominar. Não se pode jurar fidelidade a um criminoso” [1].
A decisão de negar obediência a Hitler se consolidou em 1º de março de 1941. Ele mesmo explica: “Pelas 11 horas, durante a recitação do breviário, recebi a carta: ordem de convocação. Não disse uma palavra. Continuei rezando. Lentamente começam a delinear-se diante de mim as consequências. Às 11h30min dirijo-me ao Santuário. Ninguém dos que encontrei me pediu informações. Ajoelho diante do Santíssimo e da imagem de graças. Começa uma luta formidável dentro de mim. Que planos tem comigo a Divina Providência? Há muito tenho o pressentimento de que não viverei por muito tempo. Também estou consciente do gênero de morte que me espera. Terá chegado a hora? Será esta a ordem de me preparar para convocação, o primeiro chamado de Cristo Rei e da Rainha Três Vezes Admirável?” [2]
A luta interna é grande, mas Reinisch vê nesta escolha a forma de realizar seu apostolado e ideal de vida de forma concreta. A oração e a reflexão para que tome a decisão correta foram constantes. Neste momento, também expõe ao Pe. Kentenich suas intenções. O Fundador o orientou a permanecer absolutamente fiel à MTA, para que tomasse a decisão acertada. Outro ponto que o levava a refletir é que muitos outros padres realizavam o juramento a Hitler, pois a própria Igreja não os proibia.
Porém, Reinisch se mantinha irredutível “minha consciência não me permite obedecer a uma autoridade que só trouxe ao mundo perseguição e chacina. Em momento alguma ele [Hitler] é autoridade querida por Deus. Por isso, nunca prestarei juramento a esse governo niilista, que se apoderou do poder pela violência, pela fraude e pela mentira”. [3]
E assim foi. Em 15 de abril de 1941 ele se apresenta à seção de recrutas e afirma que não deseja se alistar, vai preso e permanece firme em sua convicção, mesmo com o processo lento e todas as dificuldades que enfrenta até a sentença final. Vai à julgamento e, após negar novamente o juramento, é condenado à morte.
Vítima de amor da MTA
É de Reinisch o famoso texto, conhecido pela Família Internacional de Schoenstatt através da música Hino de Franz Reinisch. O poema foi composto em 9 de agosto de 1942, na prisão de Tegel, poucos dias antes de sua morte, que aconteceu em 21 de agosto.
Cantado a plenos pulmões, especialmente pelos jovens da Juventude Masculina, o texto reflete a entrega de amor do sacerdote, que viveu ao extremo seu ideal pessoal Viver e morrer como ardoroso Apóstolo de Schoenstatt.
“Tu és o grande sinal, cheio de luz e resplendor do sol,
Toda abrasada pelo amor de Deus!
Eu quisera, Maria, pura donzela, ser por ti inflamado
como chama de amor no pequeno Santuário.
De pé estás junto da cruz, como Rosa da Paixão
grande e silenciosa, pronunciando o teu “sim” ao sacrifício,
porque assim Deus o quer.
Hoje, de novo, Deus chama uma legião de heróis,
por isso, Mãe, me ofereço como vítima de amor
Rainha do Universo, imperturbável na tormenta dos tempos,
destrói a estirpe de Satanás, vencedora na luta.
Dá-me ser teu apóstolo, como cavaleiro aqui estou,
e ao morrer quero dizer sorrindo:
Ó querida MTA!”
E nossa consciência?
O exemplo de Franz Reinisch deve nos levar a uma reflexão profunda. Até que ponto estou disposto a seguir a Cristo e a Mãe? Quais as situações em que não fui firme em minhas convicções, cedi aos impulsos do mundo ou me deixei levar pelo mais fácil?
Falamos tanto sobre a corrupção, problemas sociais e quantas vezes nós mesmos caímos nas pequenas corrupções do dia a dia. Sigamos o exemplo de Reinisch e, que, na próxima vez em que cantarmos e vibrarmos ao repetir seu poema, lembremos exatamente o que ele quis nos ensinar.
Mais informações sobre Franz Reinisch
É possível ler a biografia de Franz Reinisch na obra O Sim e o Sangue. O resumo de sua vida também pode ser encontrado aqui. Seus restos mortais foram levados, em 17 de outubro de 1946, para junto do Santuário Original de Schoenstatt e dos primeiros heróis que o inspiraram. Franz Reinisch está em processo de beatificação e, no início deste mês a fase diocesana foi concluída.
Referências
[1] CESCA, Olivo. O sim e o Sangue, pág. 37
[2] CESCA, Olivo. O sim e o Sangue, pág. 38
[3] CESCA, Olivo. O sim e o Sangue, pág. 41