O isolamento vai terminar, mas: como ficarão as relações após tudo isso?
Romulo Romanato – Eis que tudo estava andando tão bem. De repente, surge uma pandemia em nossa vida e tudo é virado de cabeça para baixo. Essa é a história do mundo atual.
Sou afastado da empresa, vou para home office, fico de férias, fui demitido, estou no grupo de risco…, enfim, por algum motivo fui para a quarentena, que parece que não tem fim e nem data para acabar. Contudo, sabemos que irá acabar. Pode estar certo: A pandemia terá fim. Mas, e a nossa vida? E o nosso casamento, nossos relacionamentos? Como estarão?
Desde o início da pandemia, preocupei-me com alguns temas que recairiam sobre todas as pessoas, devido a essa situação mundial. Entre esses temas, um, em especial, passa desapercebido pela mídia e os “analistas de plantão”: Os relacionamentos de casais, ou seja, os casamentos: Como eles iriam sobreviver a essa quarentena – que já virou “sessentena” e tem tudo para se tornar “noventena”?
Hoje, gostaria de falar sobre os casamentos
Porque, dentre todos os assuntos da pandemia, exceto o da vida, da saúde, que temos que tentar preservar a qualquer custo, os outros temas poderemos tentar resolver no pós-pandemia. Mas, essa questão do casamento trará, para muitos, problemas e situações que podem ser irreversíveis.
Muitas casas foram “invadidas” pelos maridos, que mal jantavam em casa, por questões de trabalho e tantos afazeres. No entanto, de repente, o meu bem amado acorda e não vai trabalhar: 1, 2, 3, 4… 60 dias e mais ainda por vir. Tudo ficou muito diferente. Nesse ambiente nunca vivido, maridos, esposas e filhos começaram a habitar, dia e noite, o mesmo espaço, como nunca antes. É natural que, se não tomarmos os devidos cuidados, uma convivência intensa em 24 horas pode trazer desgastes nos relacionamentos.
Escrevendo esse artigo, infelizmente recebo uma mensagem de um casal de amigos, do qual fomos padrinhos de casamento e eles também de nós, com 31 anos de matrimônio, que resolveram se separar. Pediram nossa ajuda e que Deus ajude, que se ajustem novamente. Deu-me uma tristeza muito grande. Porque, nessa semana, estava em meu coração escrever sobre isso e mal podia imaginar que aconteceria isso justamente com amigos tão queridos.
O texto é longo, eu sei. Não consigo escrever pouco. Mas, se achar que vale o esforço, clique e continue a ler.
A pandemia salienta alguns tipos de casais
Em todos os países atingidos pela pandemia, o número de separações tem crescido assustadoramente. Para refletir melhor, vamos identificar quatro situações:
1 – Casais que já tinham algum problema antes, que se aturavam, mas que a convivência tão intensa tornou o relacionamento insuportável. Essa obrigação de estar juntos foi o fogo que a gasolina esperava e tudo explodiu rapidamente.
2 – Casais que tinham poucos problemas, se desentendiam de vez em quando. Porém, essa situação de estresse está deixando todo mundo de paciência curta e, de repente, surgiram discussões por motivos que não haviam antes.
3 – Temos aqueles casais que, praticamente, não tinham nenhum atrito ou problemas de diálogo e essa pandemia trouxe alguns riscos na lataria, que se resolvem com pouca tinta. É só ter calma que tudo volta ao normal.
4 – Logicamente, há os casais que tiveram nessa pandemia a oportunidade de reverem suas vidas, de reafirmarem a sua fé e crescerem na ajuda mútua.
São quatro situações presentes em milhares de famílias. Eu gostaria de falar, nessa reflexão, especialmente para aqueles casais que não veem a hora da pandemia acabar, para dar fim ao seu casamento; para os casais que estão na beira do abismo da separação e, também, para os casais que, percebendo ou não, estão a caminho para o término de seu enlace.
A situação causada pelo Covid-19
Inicialmente, gostaria de dizer que seu esposo, sua esposa e, tampouco, seus filhos são culpados por essa situação. A culpa, com certeza, não está dentro de casa. Por isso, em primeiro lugar, não culpe alguém. O responsável por tudo isso se chama Covid 19, que chegou de uma maneira inesperada no mundo inteiro. Até mesmo nos países que acreditavam ter o domínio sobre tudo, foram surpreendidos. Acredite nisso, que é certeza: Isso irá acabar.
Chegou a hora de amar!
Diante deste cenário, podemos dizer com eloquência e segurança: agora, mais do que nunca, é a hora de amar. Veja que não escolhi nenhuma palavra, tipo: é hora de se unir, é hora de colaborar, é hora de perdoar, é hora de ter fé, é hora disso ou aquilo. Eu disse claramente e vou repetir, destacando em negrito novamente, mas aumentando as letras: Esta é a hora de amar.
Porque digo isso? A solução para a guerra, ao contrário do que muitos dizem, não é a paz. A solução para a guerra é o amor. Porque a paz é fruto do amor. Alguns podem ter pensado: “Nossa! Mas, isso é obvio!” Vou contestar com veemência: Não! Isso não é obvio! Muitos – mas põe muitos nisso – desejam a paz, como se fosse por meio de um passe de mágica. Gritam desesperadamente: “Minha casa parece um inferno. Precisamos de paz. Não temos paz nessa casa” e por aí vai.
Onde não tem “paz”, significa simplesmente que o amor está em falta, não está sendo praticado e, por isso, a paz é um bem escasso. Onde o amor reina, reina a paz. A paz é uma companheira do amor. A paz e o desamor não andam de mãos dadas. Aliás, quando um chega, o outro sai rapidamente.
Quando Jesus diz: “Eu vos dou a Paz” (Jo 14,27), é o Seu amor que Ele deseja partilhar. Em sua essência, “Deus é amor” (1 Jo 4,8). Ele é o puro amor. Por isso, a paz exala de seu coração misericordioso. Só transmite paz, quem verdadeiramente ama. Portanto, se queremos que a paz volte em nossos lares, precisamos urgentemente amar. Precisamos urgentemente voltar a amar.
“O Amor é a Lei Fundamental do Universo”
Pe. José Kentenich disse isso e eu diria hoje: o Amor é a Lei Fundamental, na qual venceremos todos os desafios da pandemia. O amor é a Lei Fundamental na qual venceremos esse grande desafio de nos manter saudáveis psicologicamente e nos mantermos casados. O Amor é a Lei fundamental de todos os nossos relacionamentos, todos, principalmente em nossos lares e também de nossas situações financeira, nesses tempos, catastróficas.
O amor é doação: porque doação me remete ao outro. Amor para si é egoísmo e egoísta não ama, pelo contrário suga tudo para si.
Para os casais que estão vivendo essa pandemia como um pandemônio, só existe um recado: Quase já passou da hora de voltar a amar.
Amar é uma decisão: quero amar ou não quero amar? Digo-lhes que aqueles que decidem amar jamais se arrependem… jamais!
Amar como Ele nos amou
Se me permitem, faço um apelo para vocês: Talvez você que está lendo esse artigo não seja casado, mas vive com alguém, talvez você seja o filho nessa história, seja um consagrado que vive sob o mesmo teto que outros membros da sua comunidade: se as rusgas da impaciência, das críticas, das manias, estão tomando conta do ambiente, voltem imediatamente ao mandamento primeiro de Jesus: Amar como Ele nos amou. Não existe um outro caminho e nenhuma outra maneira de restabelecer a paz do que amando, verdadeiramente. Essa é a Lei fundamental do Universo.
Meios para cultivar o amor
Para todos os casais, independentemente da crise, sugerimos algumas dicas para cultivar o amor:
Que tal lembrar de como se conheceram? O que os cativou um no outro?
Recordar como foram os primeiros encontros e as juras de amor
Recordar o namoro, as qualidades do outro que me fascinam
Recordar a data do casamento, com os acontecimentos e a atmosfera daquele dia. Naquele exato dia nasceu a sua família, por meio do Sacramento do Matrimônio. Porque não olhar as fotos ou, se houve, também os vídeos? Rever e reviver juntos.
Rever as fotos do nascimento dos filhos, aquele que talvez tenha sido o dia mais feliz de todos, até então, como família
Relembrar todas as superações: como venceram as dificuldades e os obstáculos.
Num diálogo respeitoso, pedir e dar o perdão. Chorem à vontade.
Precisamos sempre ter esses momentos. É a isso que chamamos de voltar ao primeiro amor. Esse primeiro amor é como uma raiz, pois ali está todo o fundamento da união. Tudo o que veio depois foi construído sobre ele e é por isso que precisamos recordá-lo e revivê-lo.
É preciso recuperar na memória o que me levou ao desejo de estarmos juntos, ao desejo de me unir em matrimônio. Fazer uma lista do que me fascina no outro. Esquecer os defeitos, não colocar a importância que eles não têm, porque todos nós os temos, até de sobra.Quem ama perdoa. Por isso, perdão e amor andam sempre juntos. Perdoe, do fundo do seu coração, todas as palavras mal ditas, as brigas, as atitudes infantis, os xingamentos, as ofensas. Por mais difícil que pareça, o perdão não tem limites. Nós é que colocamos as cerquinhas de até onde podemos ir.
Saia de frente da televisão, do computador, das redes sociais. Não se deixe contaminar por notícias tão ruins, que levam a crer que o mundo está acabando. Eleve-se às alturas, saia do chão. Você tem muita dignidade, acredite nisso. Estás passando por problemas financeiros? Vamos todos superar. O que muitas vezes acontece é que ficamos preocupados com as coisas que passam e nos esquecemos das coisas verdadeiramente importantes. Sua família é o bem mais importante em sua vida. Problemas financeiros são os principais motivos das separações. Mas, isso não deve prevalecer sobre o amor.
Seu maior tesouro chama-se família
Desculpe-me deixar isso bem claro. Mas, emprego se arruma outro, dinheiro se ganha no trabalho. Porém, família não se forma em qualquer lugar. Não acredite na história que vou achar marido ou esposa melhor. Que ilusão!
Se você acredita nos sacramentos, saiba que o sacramento do Matrimônio contém todas forças que precisamos para enfrentar todo e qualquer obstáculo que o mundo nos apresenta. A família é o bem maior da sociedade, é o cerne do plano de Deus para a humanidade.
Nosso Pai e Fundador, Pe. José Kentenich, diz a todos nós, hoje mais do que nunca: “Salvai a família, custe o que custar”. É um imperativo! É uma ordem para cada um de nós: Comece salvando a sua, custe o que custar. Por isso, não devemos ter nenhum tipo de constrangimento em pedir e dar o perdão. Às vezes o orgulho torna isso muito difícil.
De quem é a culpa?
Na história da criação, o bom Deus deu a Adão todas as regras do Paraíso: muitas tarefas e alguma proibição. Eva foi criada depois. Vejam que a serpente enganou Eva. Será que Adão não deveria ter protegido a sua família? Veja que quando Deus pergunta a Adão, ele logo responde: Foi a mulher, a companheira que me deu, que me fez comer da fruta. Essa frase é como se ele dissesse que a culpa era de Deus, porque Ele é quem tinha dado Eva por companheira. Depois, Eva diz: Foi a serpente que me enganou. Vejam que nada adiantou empurrar a culpa para o outro, porque os dois foram expulsos do paraíso.
Por que relembrei o pecado original? Porque essa atitude ainda está em nós: Colocar a culpa sempre no outro. O problema de uma separação sempre é o outro, sempre. Dificilmente assumo a minha parte da culpa.
Vou perguntar, então: De quem é a culpa desse ambiente de discussões e brigas em casa? Se você não respondeu: “É minha”, acho bom você refletir um pouco mais.
O lado positivo do isolamento
Por outro lado, temos muitas e muitas famílias que encontraram nesse isolamento, nessa quarentena, o sentido de viver. Descobriram como é bom ver a esposa, ajudá-la no dia a dia, arrumar as coisas que estavam pendentes na casa, tomar as refeições com os filhos, algo que era raro. Das esposas que, nesse período, podem ser esposas, no bom sentido, que podem estar com os filhos e entendê-los melhor, que pode preparar as refeições para a família, etc. Saliento que é necessário que ela não se torne a “empregada” da casa e todas as tarefas sejam partilhadas (aos maridos eu pergunto: Quanto você está ajudando em casa?).
Principalmente, há casais que encontraram, nesse período, a oportunidade para rezar juntos, para praticar melhor a sua fé. Juntos, de corações unidos, estão superando todos os terríveis desafios que essa pandemia nos impõe.
Qual é a memória dessa pandemia que estamos gravando em nossos filhos? O que ficará gravado na mente deles? Ficará gravado em seus corações discussões e mau humor, ou ficará gravado a vivência de fé na Divina Providência, de amor, respeito, fé e esperança que venceremos juntos, custe o que custar?
O amor vem de Deus
Para concluir, gostaria de lembrar que o amor provém de Deus. Todo e qualquer ser humano que deseja amar, precisa aprender isso de Deus e estar vinculado, de alguma forma, a Ele. A oração, os sacramentos são formas pelas quais nos unimos a Deus e Dele recebemos o amor que partilhamos. Jesus deu a maior prova de amor que possa existir: Entregar a sua vida por todos nós, por amor. Em tudo, tudo mesmo, o que sentimos e o que fazemos, deve ter o selo do amor, como diz São Paulo em sua carta a Coríntios (1 Co 13, 1-13):
“Mesmo que eu falasse a língua dos anjos, mesmo que eu tivesse todo o conhecimento, mesmo que desse tudo o que tenho aos pobres e entregasse o meu corpo para ser queimado, se eu não tiver amor, de nada serve, porque o amor é paciente, o amor é bondoso, o amor não tem inveja, não se vangloria, não tem orgulho, não maltrata, não procura os seus interesses, não se ira facilmente, nem tampouco guarda rancor, não se alegra com a injustiça, mas ao contrário, o amor se alegra com a verdade, porque tudo sofre, tudo crê, tudo espera e tudo suporta”.
“O amor jamais acabará”.
Simplesmente porque Deus é amor e Deus vive para sempre. Ele é o alfa e o ômega, o princípio e o fim.
Não sou perfeito, longe disso. Considero-me um servo dos mais imprestáveis, mas servo. Ainda preciso muito aprender a amar, dia a dia. Amar sempre e até o fim, sem jamais desistir.
Venha conosco nesse anseio: amar!
Que colocação formidável sobre o matrimônio e a pandemia. Aqui em casa já foi um pouco diferente… marido aposentado e eu trabalho como pedagoga. Com início da pandemia, trouxe meu trabalho pra dentro de casa. Foram dias horríveis e tensos, pois a educação foi transformada inteiramente a distância. Com muito trabalho, que eu tinha e tenho que administrar com os da casa. Tivemos dias bem conflituosos, mas seguros na fé, vamos confiando e nos alimentando desse amor decisão.
Bênçãos da MTA
Excelente colocação a respeito do momento atual em que vivemos. Tempos difíceis e desafiantes, contudo, uma oportunidade única para crescermos como pessoas, analisando tudo à luz da fé. Em nossa família estamos procurando viver mais intensamente cada momento, valorizando as pequenas coisas e gestos que antes passavam despercebidos. Também está sendo uma ótima oportunidade para lermos mais e aprofundar nossos conhecimentos sobre a espiritualidade de Shoenstatt. Que a nossa querida Mãe e Rainha abençoe a todos nós!