Aprender a encarar os desafios dos tempos com uma resposta de amor
Jaqueline Montoya – Certamente em algum momento da quarentena, ou dos últimos meses, você pode ter se deparado com chamadas na internet ou comentários citando a expressão “cultura do cancelamento”. O termo faz referência a uma nova forma de convívio social estabelecida por alguns grupos de internautas. Em poucas palavras: deixar de seguir determinado perfil, grupo ou página (seja de personalidade pública ou não/empresa ou produto) ao se deparar com uma atitude ou posicionamento considerado “inaceitável” para os dias atuais.
A busca pelo politicamente correto
A cultura do cancelamento ganhou tanto destaque que, em 2019, foi eleito o “termo do ano” [1]. Sinal de sua atual relevância, devemos nos atentar a alguns detalhes do que está por trás do “cancelamento” de alguém.
Desencorajar posturas e atos incorretos ou impraticáveis é uma atitude considerada positiva – e pode ser de fato. Mas temos que estar atentos, como cristãos e schoenstattianos: o que isso pode significar?
O imediatismo da internet, a exposição do particular ao público e o julgamento rápido fazem com que a tolerância zero seja adotada, em muitos casos. Basta um ‘post’ com o qual não concordo e pronto: ‘cancelado’. Simples, não?! Mas e na vida real? Será possível cancelar todos com os quais discordo? Como me posiciono em situações de divergência?
O “cancelamento” também traz outros questionamentos: a internet tem cada dia mais se tornado um tribunal implacável. Em muitos casos, cancelar ultrapassa a questão da diferença do aceitável e se torna uma questão pessoal, até mesmo um discurso de ódio pela não aceitação daquela ideia. Além disso, há situações em que mal-entendidos geram o cancelamento e o julgamento imediato da internet não dá nem chances para esclarecimentos. Todos estes elementos tornam o tema uma discussão ampla e ainda mais complexa.
Lidar com o diferente, com opiniões e posturas contrárias é parte do convívio em sociedade. Parte que pode estar cada dia mais se perdendo, porque o diálogo parece não ser mais opção para muitos. É mais fácil atacar, criticar, “cancelar” do que dialogar e respeitar opiniões, mesmo quando discordamos delas.
Cultura do encontro… cultura da Aliança
Se o cancelamento ganha força, quem o rejeita também. O Papa Francisco, desde o início de seu pontificado, nos apresenta uma chave para vencer os problemas dos tempos atuais, marcados pela indiferença e o ódio: a cultura do encontro. Cultura do encontro que, como ele mesmo disse a nós schoenstattianos, também pode ser traduzida em ‘nosso linguajar’ como cultura da Aliança: trilhar um caminho juntos.
Muitas vezes, o Papa nos alerta para estarmos atentos e abertos ao outro. Para Francisco, o encontro não é apenas um momento, em que depois cada um segue seu rumo, mas um marco para as duas pessoas. “As pessoas cruzam-se entre si mas não se encontram (…) não é suficiente ver, não: é preciso olhar — se não paro, se não olho, se não toco, se não falo, não posso realizar um encontro, não posso ajudar a construir uma cultura do encontro”, afirmou o pontífice em 2016 [2].
Buscar pontes e não muros
A busca por pontes deve guiar nossa atitude diante do outro. Como o Papa nos lembra, “aqueles que constroem os muros acabarão presos pelos muros que construíram. Mas, aqueles que constroem pontes vão muito à frente. Para mim, construir pontes é algo que vai quase além do humano, exige muito esforço” [3].
Assim como na vida de Aliança de Amor: não podemos simplesmente fechar os olhos para aquilo que discordamos. A cultura da Aliança nos desafia, a cada dia, a ouvir a voz de Deus no meio dos acontecimentos diários, a interpretar os sinais dos tempos. Se me fecho em meu mundo de “cancelamentos”, como poderei ver o que os tempos me dizem? Nosso Pai e Fundador nos ajuda na reflexão, ao explicar as dimensões da Aliança de Amor: “Necessitamos empenhar-nos a fim de nos vincularmos pelos laços do amor, pessoa com pessoa… A aliança de amor com a Mãe de Deus tem de se tornar, sempre mais, em nossas fileiras, aliança de amor com o Deus Trino, aliança de amor entre nós, aliança de amor com todos os homens do mundo”[4]
“Dificuldades da época são tarefas da época” [5]
Se entre tantas luzes no mundo hoje, encontramos também trevas e dificuldades (seja ele real ou virtual), o Pai e Fundador, Pe. José Kentenich, nos lembra que “estamos acostumados a utilizar a época atual como livro de estudo. Isso nos dá um impulso vigoroso a abraçar com grande ardor o que hoje se rejeita” [6].
Que à luz da Aliança de Amor possamos sempre buscar o caminho do diálogo. Frente às situações de dúvida ter uma atitude coerente de observar, analisar, dialogar e só então me posicionar. Bem como nos ensinou o Fundador: em cada situação da vida “observar – comparar – resumir/extrair um princípio e aplicar”.
Referências:
[1] O termo foi eleito pelo Dicionário Macquarie, responsável por selecionar anualmente palavras e expressões que mais moldaram o comportamento humano. Fonte: https://canaltech.com.br/redes-sociais/a-cultura-de-cancelamento-foi-eleita-como-termo-do-ano-em-2019-156809/
[2] PAPA FRANCISCO, meditações matutinas na santa missa celebrada na capela da Casa Santa Marta, 13 de setembro de 2016 http://www.vatican.va/content/francesco/pt/cotidie/2016/documents/papa-francesco-cotidie_20160913_cultura-do-encontro.html
[3] PAPA FRANCISCO, diálogo com jornalistas no voo de retorno do Marrocos, 31 de março de 2019 https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2019-03/quem-constroi-muros-permanece-prisioneiro-papmar.html
[4] PE. JOSÉ KENTENICH. Schoenstatt e a Igreja, p. 18
[5] PE. JOSÉ KENTENICH. Filialidade Heroica – Brasil Tabor 2, pág. 52
[6] PE. JOSÉ KENTENICH. Filialidade Heroica – Brasil Tabor 2, pág. 53