Como ele ajudou centenas de padres a superarem as dificuldades no campo de concentração?
Ir. M. Isabel Machado – O Pe. José Kentenich chega ao campo de concentração de Dachau, Alemanha, no dia 13 de março de 1942. A realidade diária era a mesma que todos os outros sacerdotes prisioneiros enfrentavam (leia mais sobre isso aqui) – mas em seu coração, que se abria sem reservas aos planos da Providência Divina, percebe as chances que Deus lhe mostrava também nesse lugar.
Além da disposição em trabalhar por Schoenstatt, Pe. Kentenich logo iniciou um serviço junto aos seus irmãos no sacerdócio procurando, tanto quanto possível, ajudar a cada um individualmente. Além disso, percebeu a necessidade de “reunir os sacerdotes prisioneiros em uma comunidade que fizesse da prisão uma escola de renovação em sua vida espiritual, conforme a vontade de Deus” [1].
O empenho individual iniciava com a chegada dos sacerdotes a Dachau. De início, os prisioneiros ficavam no Bloco de entrada, numa espécie de “quarentena”, e por isso não podiam participar da Missa celebrada no Bloco 26. Como uma ajuda espiritual, todas as noites o Pe. Kentenich oferecia uma pequena conferência aos que quisessem participar. Essa e outras atividades religiosas (com exceção da Santa Missa) eram totalmente proibidas no campo. Mas, desde a sua chegada, Pe. Kentenich conquistara a confiança e principalmente o respeito do chefe do bloco de entrada e do chefe dos alojamentos, que, mesmo sendo ateus, de alguma forma protegiam tais pequenas atividades religiosas.
“Devemos muito ao Pe. Kentenich que, à noite, na rua do bloco e, mais tarde, num canto do dormitório, dava pontos de meditação. Por muito tempo foi o único alimento espiritual que recebemos”, assim testemunha o Capelão Pe. Hans Carls, na época diretor da Caritas de Wuppertal.
As pregações noturnas, e algumas diárias, continuaram depois também no bloco 26, unidas às pregações durante as Santas Missas. Pe. Kentenich reconhece que diante das aflições humanas, que assolam também os sacerdotes, era importante não despertar emoções passageiras, mas oferecer um programa de esforço comum e a longo prazo para os padres prisioneiros: “Nós sacerdotes queremos, em prontidão humilde e corajosa, empenhar-nos por Cristo Rei para a construção e o aprimoramento de seu reino de verdade e de amor!”
Seu desejo profundo era que os sacerdotes pudessem, de alguma maneira, aproveitar este tempo em Dachau – visto à luz da Providência Divina – como uma espécie de segundo seminário para continuarem a formar-se como sacerdotes e pastores de almas, preparados para atenderem – depois da guerra – os fiéis na nova situação da Igreja e do mundo.
De janeiro a março de 1943, houve uma quarentena imposta em todo o campo, devido à epidemia de tifo. Com o desejo de fortalecer interiormente os padres em sua vocação e assim abrir-lhes perspectivas para o futuro, Pe. Kentenich dava diariamente duas conferências no dormitório do Bloco 26. Ali participavam, geralmente, cerca de 100 sacerdotes. Os temas falavam da vida sacerdotal em tempos difíceis e da santidade da vida diária. Com os sacerdotes prisioneiros de outras comunidades – beneditinos, franciscanos e jesuítas – ele organizou um ciclo de conferências sobre essas diversas espiritualidades.
O crescente interesse dos sacerdotes, no campo, pela espiritualidade de Schoenstatt levou à formação de grupos: dois grupos da União e cinco grupos da Liga. Estes grupos, formados por sacerdotes de distintas nacionalidades, superou a imposição imposta pela SS: “poloneses, tchecos, italianos, franceses, belgas, holandeses e alemães unidos entre si no amor à Mãe de Deus e na realização da missão da Igreja” (Pe. Monnerjahn – ibd).
Esses padres partilhavam tanto os “bens espirituais”, como os poucos bens materiais que recebiam nos pacotes que eram enviados. Dessa forma, se fortaleciam unidos na oração, no amor efetivo e na aspiração – de forma a contradizer totalmente o desejo do nacional-socialismo de que o campo se tornasse uma “pré-experiência do inferno”.
No inferno de Dachau, cidade de pagãos, de loucos, de morte, os sacerdotes desses grupos selaram sua Aliança de Amor com a Mãe de Deus. As medalhas de Aliança foram feitas no próprio campo por um prisioneiro polonês, segundo os desenhos dos mesmos prisioneiros schoenstattianos.
Durante o ano de 1944 dois grupos selaram a Aliança de Amor: “Círculo das Mãos” e “Círculo do coração”. Podemos imaginar com que profundidade e seriedade ressoaram em seus corações as palavras do Fundador: Recebam estas medalhas “como símbolo de eterna inimizade com todo o anti-divino e o não divino…. E de sua entrega total à Mãe e Rainha Três Vezes Admirável de Schoenstatt e à sua Obra”.
Na entrega à nossa Mãe de Schoenstatt tornou-se realidade o que os sacerdotes prisioneiros mesmos gravaram na porta do Tabernáculo de Dachau: “Eis que estou convosco todos os dias!” Todos os dias – também aqui! Também agora!
[1] MONNERJAHN, Pe. Engelbert. Pe. José Kentenich: Uma Vida pela Igreja. pág. 153