Flávia C. Ghelardi* – Neste artigo, apresentaremos a análise da última parte do capítulo VII da Amoris Laetitia que trata da educação sexual e da transmissão da fé.
Sim à educação sexual
A educação da sexualidade humana é uma etapa importante na formação de uma pessoa madura. O Papa Francisco ressalta que a educação sexual, numa época em que a sexualidade está tão banalizada, só faz sentido se for uma educação para o amor, para uma doação mútua. É importante desenvolver uma educação que, através do conhecimento de si mesmo, oriente sobre a capacidade de autocontrole e sua importância na compreensão sobre o que é o verdadeiro amor.
O Papa ressalta que há muita informação disponível, mas muitas vezes chega às crianças e jovens que ainda não tem maturidade para compreendê-las. “A informação deve chegar no momento apropriado e de forma adequada à fase que vivem. Não é útil saturá-los de dados, sem o desenvolvimento do sentido crítico perante uma invasão de propostas, perante a pornografia descontrolada e a sobrecarga de estímulos que podem mutilar a sexualidade. Os jovens devem poder dar-se conta de que são bombardeados por mensagens que não procuram o seu bem e o seu amadurecimento.” (AL 281)
É fundamental uma educação para o pudor, que “é uma defesa natural da pessoa que resguarda a sua interioridade e evita ser transformada em mero objeto. Sem o pudor, podemos reduzir o afeto e a sexualidade a obsessões que nos concentram apenas nos órgãos genitais, em morbidades que deformam a nossa capacidade de amar e em várias formas de violência sexual que nos levam a ser tratados de forma desumana ou a prejudicar os outro” (AL 282)
Outra ressalva feita pelo Santo Padre é com relação a expressões como “sexo seguro” ou a “se proteger”, pois induz ao erro de enxergar a vinda de um filho como um “mal a ser evitado” ou um “inimigo do qual é preciso se proteger”. Essa mentalidade estimula um comportamento egoísta e narcisista, que busca o próprio prazer não se importando com as consequências; um comportamento que deseja o prazer do ato, mas não a sua consequência, que é a possibilidade de uma gravidez.
É muita irresponsabilidade estimular os adolescentes e jovens a “brincarem” com seus corpos e desejos ao invés de ensiná-los que a entrega mútua dos corpos de um homem e uma mulher só é expressão de amor verdadeiro caso ambos tenham assumido um compromisso público de cuidado mútuo por toda a vida, através do sacramento do matrimônio.
É preciso não enganar os jovens, levando-os a confundir os planos: a atração « cria, por um momento, a ilusão da “união”, mas, sem amor, tal união deixa os desconhecidos tão separados como antes». A linguagem do corpo requer uma aprendizagem paciente que permita interpretar e educar os próprios desejos em ordem a uma entrega de verdade. Quando se pretende entregar tudo duma vez, é possível que não se entregue nada (AL 284)
É bonito como o Papa ensina sobre a aceitação das diferenças e do próprio corpo, na sua feminilidade ou masculinidade, para conseguir reconhecer a si mesmo no encontro do outro que é diferente. Aceitar que a própria condição de ser homem ou ser mulher é um dom, um presente, obra do próprio Deus criador, que fez a cada um com sua originalidade para que possamos ajudar a complementar o outro e assim, enriquecer-nos mutuamente. “Só perdendo o medo à diferença é que uma pessoa pode chegar a libertar-se da imanência do próprio ser e do êxtase por si mesmo. A educação sexual deve ajudar a aceitar o próprio corpo, de modo que a pessoa não pretenda « cancelar a diferença sexual, porque já não sabe confrontar-se com ela»”. (AL 285)
Transmitir a fé
As inúmeras tarefas da vida moderna dificultam a transmissão da fé, todavia a família deve continuar a ser lugar onde se ensina a perceber as razões e a beleza da fé, a rezar e a servir o próximo. “A fé é dom de Deus, recebido no batismo, e não o resultado duma ação humana; mas os pais são instrumentos de Deus para a sua maturação e desenvolvimento” (AL 287). Para que seja possível a transmissão da fé, é necessário que os pais tenham uma experiência de uma plena confiança em Deus, que recorram a Ele em suas dificuldades e alegrias, pois só se pode entregar ao outro aquilo que se possui.
Cada filho tem uma necessidade e uma perspectiva diferente em relação à fé, assim é necessária uma individualização nessa transmissão. As crianças precisam de símbolos, gestos, narrações das histórias. Encantam-se com os rituais que devem ser explicados de uma forma que entendam o que está acontecendo. Para os adolescentes, é importante estimular que tenham suas próprias experiências pessoais da fé e conheçam testemunhos inspiradores de pessoas que viveram bem a sua fé, como a vida dos santos.
É fundamental que os filhos vejam de maneira concreta que, para os seus pais, a oração é realmente importante. Por isso, os momentos de oração em família e as expressões da piedade popular podem ter mais força evangelizadora do que todas as catequeses e todos os discursos. (AL 288)
O ato de transmissão da fé aos filhos pode se tornar uma ação evangelizadora para além dos membros da família, onde espontaneamente se fala da fé aos que se aproximam do convívio familiar. Isso é um grande testemunho para os filhos que aprendem a tratar o tema da religiosidade com naturalidade, vendo a importância de manterem firmes suas convicções, não aceitando tudo o que o mundo nos impõe.
“A família torna-se sujeito da ação pastoral, através do anúncio explícito do Evangelho e do legado de múltiplas formas de testemunho, nomeadamente a solidariedade com os pobres, a abertura à diversidade das pessoas, a salvaguarda da criação, a solidariedade moral e material para com as outras famílias, especialmente para com as mais necessitadas, o empenho na promoção do bem comum, inclusive através da transformação das estruturas sociais injustas, a partir do território onde vive a família, praticando as obras corporais e espirituais de misericórdia” (AL 290)
O Santo Padre encerra esse capítulo exortando que é no coração de cada família que deve ressoar o anúncio do amor do Pai, que é experimentado por cada um, e assim se tornem verdadeiras igrejas domésticas e fermento evangelizador da sociedade.
Este artigo faz parte da série de artigos que sintetizam a Exortação Apostólica Pós-Sinodal Amoris Laetitia do Santo Padre, o Papa Francisco
*Flávia e seu esposo Luciano são membros da União de Famílias de Schoenstatt