II Domingo do Tempo Comum
Pe. Carlos Padilla Esteban – O seguimento começa com um chamado, com um convite a decidir-se por viver algo grande:
«Naquele tempo, João estava de novo com dois de seus discípulos e, vendo Jesus passar, disse: ‘Eis o Cordeiro de Deus!’ Ouvindo essas palavras, os dois discípulos seguiram Jesus. Voltando-se para eles e vendo que o estavam seguindo, Jesus perguntou: ‘O que estais procurando?’ Eles disseram: ‘Rabi, onde moras?’ Jesus respondeu: ‘Vinde ver’»
Eu penso naquele dia. Tudo o que hoje é contado aconteceu um dia. Tem dias que passam rápido, semanas, meses. E outros que marcam uma vida para sempre. No Evangelho de João, ele nos fala sobre o chamado dos discípulos: gradualmente e pelo nome. Cada um tem uma história, uma hora. Às quatro da tarde: a hora de suas vidas. A hora que começam a segui-lo. […]
Os primeiros discípulos ouvem João e, sem hesitar, seguem Jesus. Eles vão atrás dele para sempre. Por fidelidade ao seu mestre, eles o deixam. Eles confiam em João. É bonito confiar em alguém tanto quanto eles. Existem pessoas nas quais confio cegamente. O que elas me dizem é a voz de Deus para mim. Os discípulos não perguntam, não hesitam. João Batista diz e eles seguem a Jesus. Não importa o quão longe. Eles ainda não se apaixonaram por Jesus e já o seguem. Pelo testemunho de João, eles acreditam. Assim começa a Igreja. Por contágio. Pelo amor de um ao outro.
Depende do nosso testemunho de vida
São João, em seu Evangelho, nos diz que o seguimento a Jesus começa com um testemunho humano, não por um chamado direto de Jesus, como acontece nos evangelhos sinóticos. Às vezes, sentimos o chamado direto de Jesus. Outras vezes, eu acredito porque outra pessoa acredita. Eu olho com os olhos dela. Escuto com seus ouvidos. Vejo luz na vida do outro e quero viver como ele. […]
Nunca houve um discípulo de Jesus sozinho. Dois a dois eles vão aderindo a Ele. É sempre assim que acontece na Igreja. Sempre foi uma comunidade. Assim começou a comunidade dos amigos de Jesus. Pelo testemunho de um, o outro acredita. Os primeiros dois discípulos acreditam por meio de João Batista. Pedro crê por meio de André. “Nós encontramos o Messias”. Pedro viu algo em André e por isso acreditou. Isso me comove. Ele não precisou ir verificar. Ele se colocou a caminho. Pedro confiava em André. Por seu irmão, já sabia que era verdade. Assim sempre acontece na Igreja, desde o princípio, a pessoa vê Jesus, se apaixona e conta para outra. [….]
Apaixonados por aquele primeiro encontro, sua vida se torna um testemunho. Eles estiveram com Jesus, tudo mudou, por isso se lembram da hora exata: “Era por volta das quatro da tarde”. Os enamorados se recordam do lugar e da hora do encontro com a pessoa amada. Aquele momento que mudou suas vidas para sempre. Recordam o lugar em que estavam, os ruídos, os cheiros; lembram de tudo com precisão. Não hesitam, guardam na memória do coração aquilo que importa. Não há fotos, mas as memórias reproduzem com nitidez o momento. Sabem as palavras e os gestos. Recordam os olhares e as lágrimas.
Foi assim com Simão, que recebeu o nome de Pedro
Este é geralmente o caso quando o Senhor entra em nossa vida e nos chama. Ele irrompe em um determinado momento. Um dia e uma hora. O momento em que me senti olhado até o mais fundo. Jesus fixou seu olhar em mim. Ele parou. E me chamou pelo meu nome – meu novo nome, aquele que envolve minha missão, aquele que estava gravado na minha alma e eu não conhecia, meu lugar, minha maneira de doar-me, meu ideal. Vivo algo deste nome, é meu, e descobrirei muito ao seu lado, no caminho. Ele me reconheceu. Eu o reconheci. Ele soube ver a sede de minha alma, minha busca, minha falta de jeito e minha paixão, meus dons, minha solidão. Minha ferida. Meus sonhos.
Eu não acreditava em mim mesmo. Sempre fui mais um. Mais um pescador. Não para Jesus. Ele fixou seu olhar em mim. Ele me esperava. E eu também o esperava. Ele mudou meu nome para aquele que Deus pronunciou ao criar-me: de “Simão” a “Pedro”. Ele me diz que eu serei sua rocha, seu apoio. A rocha que se romperá de dor, de amor. A rocha que meu pecado vai quebrar tantas vezes. A rocha quebrada que Jesus, apesar de tudo, seguiu amando ainda mais. A rocha onde todos se apoiarão.
Tudo mudou naquele dia, naquela mesma hora, quatro da tarde. Não sei o que vi Nele. Não sei o que aconteceu em meu coração. Toda a minha vida se encaixou. Minha vida começou de verdade. Eu quero estar com Ele. Porque Ele me amou. Porque ele me acolheu como eu era e acreditou no que eu poderia ser. Porque ele queria estar comigo.
Tudo começa com um encontro profundo
Tudo começa com um encontro profundo, com uma experiência gravada na alma. Eu também, como João, me lembro inclusive a hora daquela vivência. Guardo no coração a hora e o dia do meu chamado vocacional. Mas guardo também outro momento que o precedeu, no qual vi Maria atuando em minha vida. Guardo esses dois momentos como um tesouro. Como eu posso esquecer? Muitas vezes, ao longo da minha vida, volto a esses instantes. Tenho a imagem gravada: a cor da paisagem, a disposição dos móveis… Um desses momentos está muito unido a Maria. Ela próxima de mim, caminhando em uma Via Sacra. O outro momento é muito unido a Jesus. No silêncio de um quarto.
Essas duas vivências têm sido fundamentais ao longo da minha vida e nunca as esqueci. Guardo o lugar, o cheiro, os pensamentos daquela hora. As palavras e o silêncio. A profundidade do coração. As lágrimas. Eu os guardo como um tesouro. Às vezes a vida passa muito rápido e não temos tempo para guardar memórias. Eu não quero esquecer. Acontece comigo como a João, eu escrevo a hora, as palavras, não esqueço.
Leituras deste domingo:
1ª Leitura – 1Sm 3,3b-10.19
Salmo – Sl 39
2ª Leitura – 1Cor 6,13c-15a.17-20
Evangelho – Jo 1,35-42
Homilia de 18 de janeiro de 2015, original em espanhol. Versão resumida, veja o texto completo em espanhol aqui: homilia