A penitência, também praticada em forma de mortificação, é necessária para sermos livres
Karen Bueno – Pense num herói, qualquer um, aquele que vier primeiro à sua memória. Pode ser um herói da ficção ou da vida real, não importa.
Pronto? Vamos agora a algumas perguntas:
– Por que você considera essa pessoa heroica?
– Como foi a vida dela: Fácil? Difícil? Exigente?
– Qual era a atitude dessa pessoa diante dos desafios?
– Como ela se preparou para enfrentar as dificuldades?
Trazemos essas questões para falar sobre algo que faz parte da vida de todos os heróis: a mortificação. É uma palavra que talvez assuste, por lembrar “morte”, mas que, na verdade, é sinônimo de “vida” se for bem aspirada. Significa a morte de tudo o que é ruim para o nascimento do homem novo.
O que é mortificação?
O Pe. José Kentenich acentuava que, para voarmos até o céu, até Deus, precisamos estar sustentados sobre duas asas: a asa da oração e a asa da mortificação. “A mortificação pertence ao ABC da vida cristã. Não há maneira de santificar-se, seja qual for, sem a mortificação” (Pe. José Kentenich)
No dicionário, mortificação está ligada ao ato de “prostrar-se”, também à ideia de “insatisfação” e de “flagelação” [1].
Na Igreja, imitando Jesus, a mortificação é o mesmo que penitência ou sacrifício. A insatisfação com o pecado leva a atos de sacrifício para chegar ao céu. “Para possuir e contemplar a Deus, os fiéis de Cristo mortificam os seus maus desejos e, com a graça do mesmo Deus, triunfam das seduções do prazer e do poder”, diz o Catecismo da Igreja Católica (2549).
Usando um exemplo prático, o Pe. Kentenich explica: “Um sadio amor-próprio nos recorda que depois de termos cometido faltas e pecados, mesmo já perdoados, permanece um certa inclinação no sentido do pecado. Se, por exemplo, repetida vezes nos deixamos levar desordenadamente pelo instinto da gula, sabemos, por experiência, que adquirimos certa debilidade para faltas desta espécie. Somente pela penitência no sentido oposto da falta conseguiremos remediar, em parte, os danos sofridos. Neste caso, fazemos bem em abster-nos de comer algo, por amor a Deus, desde que não prejudiquemos a saúde”. Neste exemplo, o ato de abster-se, o jejum, é a mortificação.
Como deve ser realizada?
“Mortificação sem amor leva facilmente à destruição da própria pessoa. O amor sem mortificação cria visionários e sonhadores”, diz o nosso Fundador.
Podemos separar a penitência, ou a sadia mortificação, em dois tipos: interna e externa. “A mais importante é a penitência interna”, salienta o Pe. Kentenich.
A penitência interna inclui três atos: 1) o reconhecimento dos próprios pecados e desvios. 2) o sentimento de vergonha e de culpa. 3) o temor de nossa fragilidade.
A penitência externa se traduz em atos concretos, tanto ordinários, ou seja, que fazem parte do nosso dia a dia (o cansaço, suportar a mudança de temperatura, o fracasso, a inquietação interior, a convivência com pessoas antipáticas, as pequenas renúncias, a prática da confissão), e atos extraordinários, que são uma escolha livre da pessoa (como jejuar, fazer vigílias e disciplinar-se).
Mas, atenção: “O cristão conhece e ama estes meios para alcançar a santidade, porém, jamais esquece que eles não constituem o mais importante. Para ele, o essencial é o espírito de penitência. Por isso age sempre com prudência” (Pe. Kentenich).
Qual o “estilo de mortificação” do schoenstattiano?
Na ascese de Schoenstatt, os gestos mais indicados de penitência estão ligados à autoeducação: para corrigir minhas falhas pessoais ou para elevar minhas características positivas. Pela Aliança de Amor e sob a condução da Mãe e Educadora, a mortificação consciente ajuda a conscientizar-nos sobre nossos pecados e faltas pessoais, a corrigi-los e, dessa forma, ser um homem novo.
É uma necessidade para o nosso tempo
Estamos em período de Quaresma e preparando o espírito para viver com profundidade a Páscoa. Ao mesmo tempo, vivemos um contexto de desafios que pede uma entrega heroica para moldar e transfigurar a realidade. Toda boa produção de Hollywood, ou alguns clássicos da literatura, traz exemplos de protagonistas que mudaram a história e, para isso, se prepararam de alguma forma. Como cristãos, aí estão nossos grandes meios de preparação para a luta: oração e sacrifício, as asas que nos fazem voar e que mudarão o curso da história.
“Não se pode conceber uma profunda renovação do indivíduo e da sociedade sem um grande movimento de sacrifícios. Assim sucedeu em todas as épocas da história do cristianismo. Assim também deverá ser hoje, em que nos achamos na transição de uma época de extraordinárias dimensões” (Pe. Kentenich).
Referências
Todas as falas do Pe. José Kentenich foram retiradas do livro: Santidade de Todos os Dias. Da vinculação a Deus – 2º Capítulo: Pela mortificação
[1] https://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=mortifica%C3%A7%C3%A3o