Ele me ama, meu nome está inscrito em seu coração.
Pe. Vandemir J. Meister – Três dias antes, silêncio. Silêncio na atmosfera, silêncio em nossos corações; talvez silêncio em nossa fé. Silêncio, porque hoje acontece a maior das injustiças por parte dos homens, em condenar Jesus Cristo à morte; e silêncio porque creio que também assombramos a Deus com a atitude condenatória por parte dos homens.
A sexta-feira, dia da interseção. Isso mesmo, da ‘interseção’ e não da ‘intercessão’. Ou seja, uma seção que termina e outra que começa, mas, ao mesmo tempo, uma contínua seção, sem interrupção.
Deus, que se mantém constante em nossa história, quis fazer uma demonstração de amor na história da humanidade: aqui está a interseção (o corte, a divisão). Hoje começa uma nova história. A história da morte e ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo. O silêncio de hoje nos causa assombro, porque voltamos a reviver o ato mais cruel dos homens, que é a condenação sem misericórdia da vida de Jesus.
O drama começa num jardim, onde Cristo estava reunido com seus discípulos, e termina no alto de uma cruz no Gólgota. Acompanhemos juntos esse drama, que também é o nosso drama de vida. O Pe. José Kentenich, fundador do Movimento Apostólico de Schoenstatt, comenta que nossa vida tem que se assemelhar à vida de Cristo: nos seus momentos gozosos, gloriosos e também dolorosos. Cada um de nós vivencia todos esses momentos no percorrer o caminho da vida.
Do alto da cruz ele olha a humanidade
O drama de Jesus hoje é ser entregue por um dos seus, que buscava uma justiça, provocando uma injustiça maior. Jesus sabe que chegou o seu momento de enfrentar a crueldade da injustiça. Nesse momento de grande aflição e tensão, lembra com amor dos seus. Que bonito escutar essas palavras de defesa que ele usa: “Já vos disse que sou eu. Se é a mim que procurais, então deixai que estes se retirem”. Jesus estava assumindo sozinho a injustiça, não queria envolver mais ninguém. Assim, entendemos que Ele morreu injustamente para nos fazer justiça.
Ao caminhar com Jesus nos momentos de condenação, sentimo-nos também condenados, sentimos quantas injustiças fortuitas são jogadas na face do Senhor. Os Sumo-Sacerdotes Anás e Caifás não demonstram misericórdia e, por isso, não têm olhos para verem a justiça. Aquele que deveria ser menos piedoso, Pilatos, é o que tem mais piedade: “Eu não encontro nenhuma culpa nele”. Mas a pressão popular foi mais forte, tapando seus olhos de justiça. “…Pilatos procurava soltar Jesus. Mas os judeus gritavam: Se soltas este homem, não és amigo de César. Todo aquele que se faz rei, declara-se contra César”.
O Reino de Jesus Cristo não foi entendido. Muitas vezes também nós não o entendemos e, por isso, o acima dito, silencia a fé.
Jesus foi trocado por Barrabás, um ladrão, negado por um apóstolo, encontra-se só diante dos poderes dos homens. Poderia rebelar-se, gritar em defesa própria, impetrar a mentira de quem o acusava, etc., etc. Não! Manteve-se em silêncio e respondendo somente o que era essencialmente necessário e verdadeiro. Suas palavras não foram suficientes para dissipar a nuvem de injustiça que pairava nos corações daquelas pessoas.
A única satisfação da turba foi ver o acusado no alto de uma cruz. Ali, Jesus olha a humanidade. Olha quanta injustiça existe, quanta falta de amor, quanta luta pelo poder, quanto uso do sagrado em causa própria, quanta manipulação do discurso da justiça, etc.
No meio de todas essas contradições, ainda acontece um momento de oásis…
Próximo à cruz de Cristo se encontram alguns que o seguiam, que o amavam profundamente. Maria, sua mãe, em momento algum esteve longe do que acontecia com seu filho. Ela era a única que tinha toda a compreensão do que estava acontecendo – e compreensão misturada com dor de coração materno.
Jesus, ao ver sua mãe e, ao lado dela, o discípulo que ele amava, disse à mãe: “Mulher, este é o teu filho”. Depois disse ao discípulo: “Esta é a tua Mãe”. O olhar de Jesus dirigido a sua mãe foi de dor e compaixão – sofrer junto com o outro. O mesmo olhar de Maria – compaixão. O meu olhar no teu olhar.
O palpitar dos corações se encontraram num momento profundo de dor. Mais que um olhar, a mensagem que esses olhares transmitiam era de mútuo compromisso. Jesus se compromete com sua Mãe e Maria se compromete com seu Filho. Sempre onde encontramos sinais de amor, ali nos emocionamos. Esta parte é uma das que mais me causa emoção no caminho do calvário.
Ao falar de sinais de amor, quero compartilhar uma história que me contaram…
Daihanna, professora com muita experiência em sala de aula, experiência essa contada nas rugas e na cor dos seus cabelos, acompanhava o aluno Rimed nas aulas de aprendizagem de idioma. Ela pediu que Rimed trouxesse um texto, para que juntos pudessem praticar o idioma; para tal, deveria trabalhar o texto em casa. Rimed encontrou um texto que lhe parecia difícil, pois continha muitas palavras sobre emoções e sentimentos.
O texto descrevia a relação de um pai com sua pequena filha, com a qual não perdia momentos para brincar, saltar, dançar e também para lhe dizer: “Te amo, minha pequena menina!” Ela cresceu e já não aceitava mais que esse velho pai lhe chamasse de ‘pequena menina’, mas ele lhe retrucava: “Você será sempre minha pequena menina”.
O tempo passou e um determinado dia ela, mundo afora, recebe uma chamada telefônica comunicando que seu pai teve um derrame cerebral. Ele estava agora deitado na cama, sem poder se mover, falar, gesticular, sem poder dizer “Te amo minha pequena menina!” Ela entra no quarto hospitalar buscando o rosto do pai. Ele a olha com esforço, mas sem poder fazer o mínimo dos movimentos, nada pode expressar. Ela não sabe se o pai a entende, mesmo assim se aproxima e o abraça fortemente. Na dor do seu coração, imagina o quanto tinham brincado, saltado juntos, quantas coisas lindas aquele jovem homem tinha lhe dito, sempre dizendo “Te amo minha pequena menina!” Ela seguiu abraçando-o fortemente, esperando que ele pudesse repetir novamente aquelas palavras que sempre gostava de usar quando se referia a ela. Assim, poderia amenizar sua profunda dor.
Ela, no silêncio do quarto, abraçada ao imóvel pai, escuta o coração dele a bater. Um milagre acontece. Ao escutar a batida do coração é como se ouvisse uma música melodiosa que lhe diz: Minha pequena menina, minha pequena menina,
minha pequena menina, eu te amo, eu te amo, eu te amo!
Assim, ela fica confortada.Ao terminar de ler a história, a grisalha professora estava em prantos, porque as expressões de amor sempre nos tocam o coração.
Nesta Sexta-Feira Santa, que possamos ter um coração sensível, para que o acontecimento da Cruz não seja somente mais uma leitura bíblica, mas que seja a história que toca profundamente a nossa alma. Do coração pulsante de Jesus na cruz, em suas últimas batidas, possamos ouvir a real mensagem dirigida a cada um pessoalmente: “Eu te amo meu pequeno menino! Eu te amo minha pequena menina!”.