Para transformar, temos que estar abertos para amar!
Pe. Vandemir Jozoé Meister – Cultura não é aquilo que entra pelos ouvidos, mas aquilo que transforma um jeito de ser! Esta frase decantou profundamente no meu coração como desafio de transformação do mundo. A transformação de um jeito de ser!
Minha decisão, ainda como jovem, pela vida sacerdotal tinha como transfundo a forte experiência de trabalho pastoral com adolescentes e jovens nas escadarias e ruelas do bairro Santa Teresa, no Rio de Janeiro. Ali via que a partir de uma experiência de fé, esses jovens aspiravam por viver e sonhar com uma nova realidade. Isso dava-lhes força para enfrentar os diferentes desafios que cada um encontrava naquela peculiar realidade social. Não era o mundo em transformação; assim porque, recém faziam três anos de experiência democrática no Brasil, e nada de espetacular mudança se prometia; mas sim o mundo de cada um daqueles jovens se transformava. Isso me tocou profundamente e foi decisivo para seguir a vocação sacerdotal: por meio da pedagogia e da fé, transformar as pessoas.
Para mim, esta experiência da pedagogia da fé foi decisiva
Sempre me moveu a política, inclusive meu pai foi político. A política tem força de transformação, mas, para mim, esta experiência da pedagogia da fé foi decisiva. Era marcante esperar a chegada daquelas crianças, pré-adolescentes e adolescentes, para a missa dominical, celebrada às 7 da manhã, num convento carmelita; vinham com os cabelos todos desarrumados, vários com a marca do travesseiro ainda no rosto e bocejando, mas sorrindo, porque conseguiram chegar para a temprana missa dominical e depois comer umas bolachas Piraquê com suco artificial, doados pelas monjas carmelitas, que se alegravam pela heroicidade desses pequenos. Depois realizávamos algumas atividades, até que alguns pais vinham chamar os filhos para o almoço.
Inquestionável é a experiência de fé e de vida daqueles que vivenciaram aquele momento. Eu e eles. Era um heroísmo para aqueles pequenos chegar às 7 da manhã à missa, mas esse heroísmo provinha da força interior de cada um, onde eram livres para ir ou não ir. O estar presente desde o início, mesmo com as marcas do travesseiro no rosto, era como uma vitória pessoal, para quem não estava acostumado a levantar cedo no domingo – e muito menos levantar cedo para ir à missa.
O amor é a força da transformação
O descritivo acima, passadas já suas décadas, hoje pode ser criticado por uns, elogiado por outros. Vai depender do ponto de vista que se queira abordar o tema e sua intenção interior de construir uma realidade pessimistas ou uma realidade humanista dos fatos. O Papa Francisco nos convida a construir um novo humanismo que, desde sua experiência pessoal franciscana, não busca “tanto ser compreendido, mas compreender”, “não tanto ser amado, mas amar”.
O amor é a força da transformação, muitas vezes repetia o Pe. Kentenich. Onde não reina o amor, não reina a compreensão, o diálogo, aceitação. Para transformar, temos que estar abertos para amar! Amor, entrega e dedicação de quem conduz e dos conduzidos. O amor tem que ser uma avenida de 2 vias, onde vai e vem. Se esta avenida tem somente uma via, o amor não tem retroalimentação e acaba esvaecendo. A Aliança de Amor feita com Maria requer essas condições. Um caminho de 2 vias, e vias totalmente liberadas para fluir o amor.
Hoje, nas distintas esperas: social, política, religiosa, administrativa, judiciária, etc, o quão carente está “a via de dupla mão”, que constrói uma Cultura da Aliança, um Novo Humanismo exortado pelo Papa Francisco.
Como estamos olhando para a realidade?
Nosso grande desafio nesta nova Cultura é de reconstruir as pontes de unidade que foram e estão sendo lentamente e gradativamente dilapidadas pelo imperialismo do subjetivismo atual, em que somos envolvidos em todas as esferas da vida. Estamos na era do “self-service e o atendimento à la carte” [1]. Isso nos leva a um subjetivismo prático e existencial. À tendência de ver tudo a partir do meu ponto de vista, dos meus sentimentos e dos meus desejos. Então, na política, no social, na jurisprudência, na religião, na administração, etc, passo com minha bandeja de refeição somente pegando o que me convém para minhas necessidades. Sou um consumista do real, do aqui e agora. Daquilo que interessa na defesa e manutenção das minhas coisas. Com isto, perde-se a visão do horizonte, do outro, do conjunto. Hoje é comum: Texto fora de contexto com pretexto! Isto é uma atitude comum nos dias atuais. Descontextualizar para ganhar partido para minha causa, meus desejos, minhas intenções, sem considerar a visão de conjunto. Até porque, a visão de conjunto exige de mim um trabalho maior de compreensão, e isso muitas vezes me causa desgastes. Hoje as pessoas não estão com anseio de compreender, pois exige tempo de escuta, diálogo, amor.
Não precisamos ir longe, basta olharmos para o momento político no Brasil, onde as instituições políticas (executivo, legislativo e judiciário) não se compreendem entre si, um usurpa o espaço do outro, por falta do diálogo, de buscar as reais intantâncias de construção da realidade. Hoje ressoa o adágio: Comunicar! Não dialogar! Maiormente se joga à esfera social, para o juizo público, mas sem o real ensejo de mudar uma realidade através dos canais competentes. Um meio moderno de massificação. Todos falam, todos discutem, mas pouco se faz!
Nossa missão é para aqui e agora
Estamos chamados por Deus para viver este tempo, esta realidade. Dela não podemos eludir. É o nosso espaço, é o nosso mundo. É nossa missão dar resposta para essa situação do tempo, não simplesmente entrar na onda. É preciso ter sermos personalidades sólidas e livres que equilibrem a sociedade. É nosso desafio de sairmos de nós mesmos e olharmos para esta realidade que está em construção, sem perder a conexão com o passado, vivendo o presente e projetando o futuro. Cultura da Aliança não busca “tanto ser compreendido, mas compreender”, “não tanto ser amado, mas amar”.
São Francisco não foi compreendido na época pela Igreja e sociedade, mas se manteve fiel e aberto ao diálogo em função de seu Amor e transformou o mundo, está transformando e transformará! Cultura é um jeito de ser!
Obres o que oras! Construa o mundo no teu entorno, aquele que você quer viver, e seja causa de transformação com aqueles que querem ser heróis contigo! Não sonhe com o sucesso, levante cedo para alcançá-lo!
[1] Gilles Lipovetsky, A era do Vazio, 1993. Pág. XIII.